24.3.07

Actual ensino artístico em Portugal é "preocupante"

Andrea Cunha Freitas, in Jornal Público

Estudo divulgado esta semana pelo Ministério da Educação. Coordenador do trabalho admite falhas, mas garante que há soluções

Professores descontentes com o estatuto das carreiras, más condições de trabalho, alunos com taxas de conclusão escandalosamente baixas, um Estado demissionário das suas responsabilidades, conservatórios que se sentem abandonados pela tutela, desequilíbrio na distribuição geográfica da rede de conservatórios públicos de Música, planos de estudo desactualizados. A lista de falhas apontadas ao ensino artístico em Portugal no estudo divulgado esta semana pelo Ministério da Educação é longa.

Porém, o grupo de trabalho, coordenado por Domingos Fernandes, especialista da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa, propõe uma "refundação do sistema", revisões curriculares, promoção de contratos de autonomia, imposição de novas e claras regras de funcionamento com a definição objectiva das missões e estratégias das instituições.

"Já não temos um país para este tipo de ensino artístico", defende o coordenador do Estudo de Avaliação do Ensino Artístico. Os resultados parecem demolidores para o Governo quando os professores denunciam o abandono e acusam a tutela de não estar a par do que se passa nestas instituições. No entanto, Domingos Fernandes, em declarações ao PÚBLICO, corrige: "Há alguma desregulação. Mas estes traços não são de agora. São de sucessivos governos. Aliás, se me perguntar quem é o responsável pelo preocupante cenário, respondo-lhe: a sociedade em geral." O documento dá especial atenção ao ensino da Música, Dança e Artes Visuais e Audiovisuais, artes onde parecem existir problemas graves, mas que, garante o grupo de trabalho, têm soluções.

"Os problemas existentes no ensino artístico especializado têm de ser enfrentados com base numa política clara para este sector do sistema educativo. Há anos que o Estado parece ter-se demitido de assumir integralmente responsabilidades que são suas."A este propósito invoca-se, por exemplo, uma "legislação que foi sendo produzida ao sabor dos acontecimentos, pouco consistente, excessivamente atomizada e que não responde aos problemas de gestão do sistema". O relatório aponta ainda para "um conjunto de escolas do ensino particular e cooperativo do ensino artístico especializado, que o Estado financia através de contratos de patrocínio, cujos modos de organização e funcionamento pedagógico são aparentemente pouco acompanhados e avaliados".

"As coisas não podem continuar como estão, sobretudo ao nível da Música", refere Domingos Fernandes, insistindo na necessidade de "refundar o ensino especializado nesta área". Segundo explica, ao longo do tempo os conservatórios têm vindo "a perder identidade", uma situação que em grande parte se deve ao regime de frequência dos alunos. "A maioria dos conservatórios adoptou o regime supletivo e a matriz deve ser o integrado", defende, considerando que, no actual contexto, os conservatórios "têm muita dificuldade em assumir-se como escolas". "Devem ser escolas de referência e excelência absolutamente incontornáveis", diz. Domingos Fernandes diz que o responsável pelo "preocupante cenário" do sector é toda a sociedade.