19.6.07

Seis meses para recuperar auto-estima

Inês Cardoso, in Jornal Notícias

Opano abre-se e os holofotes acendem-se sobre o palco no dia 1 de Julho. Na primeira fila, os 26 parceiros europeus vão avaliar o desempenho dos "actores" na condução das políticas comuns. Numa segunda linha, dez milhões de portugueses. Poderá a presidência mobilizá-los e contribuir para novo dinamismo interno?

A resposta não merece hesitações a Jaime Silva, ministro da Agricultura, para quem a condução de uma Europa a 27 é, "para um país com uma dimensão pequena como o nosso", um evento que "por si só nos deve dar auto-estima". A imagem das luzes orientadas para Portugal é sua e justifica-se pelo particular momento de debate para desatar o nó do Tratado europeu. "Esse impasse coloca-nos, durante seis meses, nos holofotes da Europa".

O "empurrão" que a presidência pode dar a nível interno é reconhecido pela maioria dos membros do Governo. O JN pediu a cada ministério (com excepção dos Assuntos Parlamentares e da Presidência, mais vocacionados para a gestão interna, e dos Negócios Estrangeiros, anfitrião e pivô da presidência), que apontasse as suas prioridades sectoriais - ver destaques em baixo - e comentasse a importância do evento para relançar a auto-estima dos portugueses.

Dos oito que aceitaram o desafio (Finanças, Economia, Ciência e Trabalho não responderam simplesmente, enquanto o da Educação explicou ter prevista para breve essa divulgação), só Alberto Costa, ministro da Justiça, sustentou que "a situação actual não se caracteriza pela falta de auto-estima ou de dinamismo, como já aconteceu noutros momentos do passado".

Já Rui Pereira, que tutela a Administração Interna, aponta o prestígio que temos lá fora como alavanca que deve reforçar a auto-estima dentro de portas. Como exemplo invoca "o reconhecimento generalizado pelo desenvolvimento do sistema SISine4ALL", cuja conclusão, no segundo semestre, permitirá abolir o controlo de fronteiras dos novos estados-membros.

Mostrar exemplos


Particularizar e mostrar exemplos concretos são também receitas de Jaime Silva, que promete levar os seus homólogos europeus ao Douro e "mostrar-lhes a excelência de que o país é capaz". Em termos políticos, pretende ainda aplicar à escala europeia o que considera serem boas receitas deste Governo é o caso do Simplex, conceito que espera estender aos dossiês da legislação alimentar, legislação da alimentação animal e legislação da rotulagem.

A receita em sentido inverso, salienta Isabel Pires de Lima, que tutela a Cultura, também será bem vinda. Ou seja, ao conseguir "fazer emergir uma nova agenda europeia para a Cultura", o Governo poderá "imprimir um novo dinamismo a nível nacional". Para isso há que reconhecer "a importância da Cultura para o desenvolvimento da criatividade e da inovação, e do próprio contributo para o Produto Interno Bruto e para a empregabilidade".

Muito do êxito e da visibilidade da presidência irá, destacam os governantes, jogar-se na construção de pontes que extravasam as fronteiras da União. A aposta no diálogo com África e Brasil (ver caixa ao lado) não esgota um esforço mais fino, que se nota na programação de cada ministério.

Na Cultura, irá realizar-se o primeiro Conselho de Parceria Permanente com a Rússia. E os eventos culturais especiais têm também uma paragem em Washington, com a exposição "Encompassing the Globe".

Na Saúde, coordenar posições com a Organização Mundial de Saúde é uma palavra de ordem, em matérias como a luta anti-tabaco, a implantação do Regulamento Sanitário Internacional ou o trabalho em torno da inovação e propriedade intelectual.

Nalguns sectores, os temas a que se pretende dar projecção mundial têm particular significado para a economia e tradição nacionais. É o caso de um encontro internacional sobre pesca ilegal, que irá realizar-se em Novembro, no Algarve.

As questões do mar merecem, de resto, particular visibilidade (mesmo não estando na primeira linha de prioridades da Defesa Nacional). Como a pasta está, dependendo dos países, em ministérios diferentes, a solução encontrada, em parceria com a Comissão Europeia, foi a realização de uma conferência de alto nível, em Outubro.

Brasil e África, apostas de marca portuguesa

Estão agendados três encontros ao nível de chefes de Estado e de Governo envolvendo países terceiros. A cimeira UE- -Brasil realiza-se logo no arranque da presidência, a 4 de Julho, em Lisboa. A 26 de Outubro, mas em Mafra, o imponente convento acolhe a Cimeira UE-Rússia. Quase no encerramento, a 8 e 9 de Dezembro, a cimeira UE-África (a primeira em sete anos).

Reforço de relações à volta do Mediterrâneo

Serão oito as reuniões ministeriais com países terceiros. Metade, embora com variações de pastas, junta os estados- -membros com os vizinhos do Mediterrâneo Sul. Estão marcadas reuniões Euromed para as pastas da Economia e Finanças, Comércio, Negócios Estrangeiros e Migrações. Numa altura em que se agrava a crise no Médio Oriente, está já agendada uma reunião com a Autoridade Palestiniana.

Prioridades levadas ao Parlamento e a Bruxelas

A apresentação detalhada das prioridades para a Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia será feita por José Sócrates, no próximo dia 27, perante a Assembleia da República. No dia seguinte, é a vez de toda a programação ser levada a Bruxelas. A dimensão das delegações e grupos técnicos, numa Europa a 27, dificulta maior descentralização de eventos, mas simbolicamente a abertura irá realizar-se no Porto. O concerto inaugural decorre a 1 de Julho na Casa da Música, seguindo-se no dia seguinte a sessão solene.