23.10.07

Até a casa perderam por não estarem legalizados

Luís Henrique Oliveira, in Jornal de Notícias

Reginaldo Tibúrcio perdeu o emprego há três meses, por estar ilegal, numa gasolineira. A família está a viver uma situação difícil


Veio à procura do Eldorado, mas encontrou um pesadelo. Reginaldo Tibúrcio, natural do estado de Goiás, no coração do Brasil, tem 34 anos e duas filhas, menores. Não trabalha há perto de três meses, desde que efectivos do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) o notificaram, por estar a trabalhar, ilegalmente, numa bomba de gasolina de Esposende. Desde então que o "paraíso", segundo aponta, que encontrara em Portugal, vem convertendo-se, a cada dia que passa, num inferno.

O imigrante, que fora, no país natal, guarda prisional, tem, actualmente, uma promessa de contrato de trabalho por parte de uma empresa de segurança. Todavia, a firma que pretende os seus préstimos exige a sua situação regularizada no país, o que "tarda em acontecer". Segundo associações de apoio a imigrantes, "milhares serão, infelizmente, os agregados que se encontram na mesma situação" (ver caixa).

"Não viemos para roubar nem para matar. Se não nos querem aqui, que nos mandem embora. Agora, acabem com este suplício, que não aguentamos mais", atira, visivelmente emocionada, a esposa de Reginaldo, Lucineide, afiançando que o agregado tem "tudo o que a lei exige" com vista à sua permanência legal no país. Porém, a resposta tarda em aparecer, o que vem dificultando, de sobremaneira, a vida à família brasileira.

"A economia que tínhamos conseguido fazer já se foi toda. Há dias, recebemos um apoio do Consulado do Brasil (de 60 euros), mas grande parte desse dinheiro também já se foi. Não viemos aqui para viver de esmolas, nem da caridade das pessoas, mas para trabalhar. Nunca passámos fome na nossa terra, e não é nossa intenção que isso aconteça aqui, mas está muito difícil", esgrime Reginaldo, tentando conter a emoção.

Há pouco mais de uma semana, a família viu-se na necessidade de deixar a moradia que ocupava, há meses, em Fão, devido a suposta comunicação dirigida ao senhorio, que teria de pagar uma multa no valor de seis mil euros caso o agregado fosse, ali, encontrado. "Isso já foi suficientemente constrangedor. Não fizemos mal a ninguém nem somos bandidos. Só queremos trabalhar. Mais nada", diz Reginaldo.

Instado, pelo JN, o SEF remeteu eventuais explicações para a legislação em vigor, alertando, ainda, para a "necessidade da situação ser sempre avaliada" pela Delegação Regional da área de residência.

Decreto aguarda publicação

Afiançando serem "aos milhares os Reginaldos existentes por esse país fora", um jurista da Associação Olho Vivo, membro do Alto-Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural, indicou que esses imigrantes aguardam pela publicação (e consequente entrada em vigor) de decreto aprovado em finais do mês de Agosto. Concretamente, o decreto que regulamentará o disposto no Artigo 88, n.º2, da Lei 23/2007, de 4 de Julho. "A lei entrou em vigor a 4 de Agosto. Porém, o artigo em causa, que dirá respeito à situação em que se encontra a maioria dos imigrantes em Portugal, viria a ser suspenso a 20 de Agosto. Aprovada, em Conselho de Ministros, dez dias depois, aguarda, ainda, por publicação", acrescentou.