16.12.07

"Os sistemas mais evoluídos apostam na profissionalização"

Andreia Sanches, in Jornal Público

As famílias de acolhimento deviam receber mais, diz Paulo Delgado. O investigador lembra que, no Reino Unido, dois terços das crianças afastadas das famílias estão no acolhimento familiar. Em Portugal são, segundo um levantamento do ano passado, 22 por cento. Paulo Delgado é docente na Universidade Portucalense e autor de um estudo comparado sobre acolhimento familiar em Glasgow, no Porto e na Galiza. Este ano publicou a segunda parte dessa investigação no livro Acolhimento Familiar - conceitos, práticas e (in)definições (Profedições).

PÚBLICO - As famílias de acolhimento recebem pouco mais de 300 euros por uma criança. É suficiente?

PAULO DELGADO - Não. Deviam ser mais bem pagas. E não é inconciliável o espírito de solidariedade e de ajuda que move estas famílias com o devido reconhecimento do trabalho que desenvolvem. Na medida de acolhimento familiar deve haver espaço para vários tipos de motivações e de actividades: famílias que decidem acolher, mas não querem receber qualquer apoio; famílias que apenas querem receber o subsídio de manutenção da criança, mas não o montante respeitante ao exercício da sua actividade. E deve ainda reconhecer que certas famílias, pelas competências que foram adquirindo, pela dificuldade das crianças que acolhem, devem ser remuneradas à semelhança do que sucede com outras actividades da administração. Na Escócia, por exemplo, contempla-se um sistema remuneratório de quatro níveis.

Concorda com a profissionalização das famílias de acolhimento anunciada pelo Governo?
O sistema deve prever essa possibilidade. Os sistemas mais evoluídos, como o do Reino Unido, o da França ou o dos países nórdicos, apostaram nessa via, ou pelo menos na consagração de um modelo que admite essa via.

O modelo do Reino Unido é dos mais antigos. Quais são as grandes diferenças em relação ao português?

É um sistema que aposta na profissionalização, que é muito especializado, que tem diversas modalidades. A selecção das famílias é muito rigorosa e inclui um curso de formação de nove sessões. No primeiro ano de acolhimento há mais formação e depois há sessões de formação contínua ao longo do tempo. As famílias estão representadas em associações. Há trabalhos de investigação e há uma grande visibilidade da medida. Aproximadamente dois terços das crianças [retiradas aos pais] vivem em famílias de acolhimento...

Há em Portugal alguma noção do sucesso da medida?

Praticamente não há estudos. Um indicador positivo pode ser - e esta é uma área com alguma subjectividade - o facto de as crianças permanecerem nas famílias de acolhimento até à idade adulta. Ao contrário do que se passa no Reino Unido, são poucos os casos em que a criança é obrigada a mudar de família.

O sistema português não tem só aspectos negativos. As crianças contam no acolhimento familiar com um espaço de segurança e de afecto e beneficiam de um estatuto semelhante ao dos filhos da família. Na recolha que fiz [junto de técnicos, famílias e crianças do concelho de Gondomar] verifiquei que as suas necessidades básicas são satisfeitas e que a sua integração escolar melhora depois do acolhimento. De um modo geral, as crianças estavam satisfeitas, não queriam sair da família de acolhimento.

O ideal era que só existissem famílias de acolhimento?

Não. A adopção é a melhor medida para alguns casos. O acolhimento