14.12.07

Tratado de Lisboa põe fim a impasse

Alexandra Marques*, in Jornal de Notícias

"A Europa vence, finalmente, o impasse político e institucional que limitou a sua capacidade de acção nos últimos anos", afirmou ontem José Sócrates, minutos antes da assinatura do Tratado de Lisboa, nos claustros do Mosteiro dos Jerónimos, perto das 13 horas. Só o primeiro-ministro britânico - retido numa sessão de perguntas do Parlamento - não o ouviu. Gordon Brown assinou o documento mais tarde, no Museu dos Coches, depois de o ministro dos Estrangeiros, David Miliband, o ter feito na cerimónia solene.

O dia - de transportes públicos gratuitos em Lisboa, "borla" que surpreendeu alguns utentes e suscitou reacções de desprezo a outros - foi de grande satisfação para Sócrates, que confirmou em entrevista à SIC a intenção de anunciar em Janeiro a via pela qual Portugal irá ratificar o Tratado Reformador. "O primeiro-ministro sempre disse que a decisão só seria tomada após o fim da presidência", lembrou ao JN um dos seus assessores de Imprensa.

Como o mês ainda está a meio e a última quinzena se reserva às festividades natalícias, Sócrates guarda a revelação para meados de Janeiro. Uma vez que o líder do PSD, Luís Filipe Menezes, já fez saber que não deseja a realização de um referendo, tem a escolha mais facilitada.

Os líderes europeus entraram nos claustros ao som de Rodrigo Leão. O presidente francês foi o último a chegar, mas decidiu ainda ir falar aos jornalistas do seu país, antes de cumprimentar José Sócrates. Sarkozy saiu da passadeira azul e seguiu na direcção oposta à do anfitrião. Depois, correu e pediu desculpa pelo inusitada quebra do protocolo.

Os dois Josés portugueses que detêm os mais altos cargos europeus - Sócrates é presidente em exercício da União e Durão Barroso lidera a Comissão - discursaram antes do presidente do Parlamento Europeu, o alemão Hans-Gert Poettering. Um momento de glória que não voltarão a ter, já que em 1 de Janeiro de 2009 acabam as presidências rotativas e o Conselho Europeu passará a ter um presidente. Gordon Brown já sugeriu até que o seu antecessor Tony Blair exerceria bem o lugar.

Sol, música e cataplana

Se Sócrates realçou "a nova arquitectura institucional", Durão Barroso preferiu sublinhar que a UE está agora apetrechada "para enfrentar os problemas globais", dando conta, ao mesmo tempo, da "coragem" revelada pelos líderes europeus na consensualização deste tratado. Já Poettering evocou a defunta Constituição, frisando que "para o Parlamento Europeu e para a maioria dos estados e cidadãos valeu a pena defender a substância do tratado constitucional".

O novo tratado foi assinado durante 25 minutos, por ordem alfabética dos 27 países da UE, pelos chefes de Governo ou de Estado e ministros dos Estrangeiros. Portugal foi o 21.º a "pegar na caneta". Após uma longa ovação e um período de silêncio, ouviu-se a "Canção do Mar", na voz de Dulce Pontes.

O almoço foi oferecido pelo presidente da República, Cavaco Silva, no Museu dos Coches, após um curto percurso de eléctrico. À mesa, sentaram-se 64 pessoas, que saborearam uma sopa de tomate, cataplana de peixe e marisco, encharcada com ananás açoriano, café e pastéis de Belém. O brinde foi feito com um vinho do Porto de 1957, a mesma idade do Tratado de Roma, fundador da CEE.

Se Gordon Brown foi um dos protagonistas do dia, por ter chegado depois da chanceler alemã Angela Merkel, a primeira a sair, e de outros 14 líderes europeus terem abandonado o local, essa distinção coube também a Mário Soares, que descerrou as lápides alusivas aos dois momentos marcantes para Portugal na UE a adesão e o Tratado de Lisboa.

* com Lusa