26.1.08

Mais de metade dos novos trabalhadores admitidos com contratos a prazo

Clara Viana, in Jornal Público

Os dados respeitantes a 2006 revelam uma realidade preocupante, mas o quadro de 2007 parece ser ainda pior, adverte investigadora. A precarização parece ter vindo para ficar


É uma tendência em alta que o Anuário Estatístico de 2006, ontem divulgado pelo INE, veio confirmar: a criação de emprego está a ser feita sobretudo por via de contratos a prazo e outras formas ditas "atípicas", como os "recibos verdes".
Do acréscimo de emprego registado em 2006 - a primeira subida em três anos -, quase 69 por cento ficou a dever-se a contratos a termo. Nesse ano, os "precários" passaram a representar 20,6 cento do total da população empregada em Portugal, contra 19,5 em 2005.

Uma realidade preocupante? "Sim, mas a de 2007 ainda é mais", disse ao PÚBLICO a economista Nádia Nogueira Simões, investigadora do Dinâmia, o Centro de Estudos sobre a Mudança Socioeconómica do ISCTE. Dados revelados pela investigadora, que tem participado nos Inquéritos ao Emprego do INE: nos primeiros três trimestres do ano passado, foram activados 67 mil contratos a prazo e afins. O peso dos precários no conjunto dos trabalhadores aumentou assim para 22,2 por cento. No mesmo período, acrescentou Nádia Simões, "foram destruídos 43.200 postos permanentes de trabalho".
Da diferença entre os que acabaram liquidados e os que foram acrescentados ao mundo do trabalho resulta que nos primeiros nove meses de 2007 foram criados 23.800 postos de trabalho. No ano anterior, segundo os dados ontem confirmados, tinham sido cerca de 37 mil.

"Existe criação de emprego, mas esta está a ser feita por via do crescimento do trabalho a termo e da destruição dos postos permanentes", resume a investigadora. "É uma tendência europeia, que o impacto da flexibilização tenderá a acentuar", frisa ao PÚBLICO o sociólogo António Casimiro Ferreira, do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. Para o investigador, que pertenceu à comissão de redacção do Livro Branco sobre Relações Laborais, "a ausência de um laço mais permanente entre o empregado e o empregador" é uma das características de base da flexi-segurança. O risco, segundo ele, é que se venha a operar uma "asiatização do modelo europeu".

Segundo Nádia Simões, a "grande rigidez das leis laborais" portuguesas poderá estar a contribuir para o aumento do número de contratos a prazo. A investigadora adianta, por outro lado, que esta situação poderá ser encarada como "normal" numa situação de retoma económica. Por parte dos empregadores, seria uma espécie de esperar para ver. Mas, face à crise actual, é provável que "a incerteza das empresas aumente", adverte.
Em 2006, e pelo terceiro ano consecutivo, voltou a diminuir o número de trabalhadores por conta própria: o seu peso passou de 25 por cento em 2003 para 22,7 em 2006. Em contrapartida, o peso do contingente por conta de outrem, onde alinham os contratados a prazo, passou de 73 para 75,6 por cento.

Outra característica do mundo do trabalho confirmada pelo anuário ontem divulgado: em 2006, os desempregados de longa duração passaram a representar mais de metade dos desempregados em Portugal, cujo número continuou a aumentar.

Mais diplomados
Mas nem tudo são más notícias. O grau de escolaridade da população activa tem vindo a subir, o que pressuporá uma maior qualificação. Em 2006, entre os activos, cerca de 763 mil tinham concluído o superior (733 mil em 2005). E mais de um milhão tinham a escolaridade obrigatória (987 mil em 2005). O número de diplomados passou de 61,1 mil para 71,8 mil em seis anos, mas, devido sobretudo à diminuição da taxa de crescimento natural, os estudantes são um grupo em regressão.

Em 2006 confirmou-se também que o grau académico pode fazer a diferença: "Apenas os trabalhadores com nível igual ou superior ao ensino secundário auferiam, em média, um ganho superior ao ganho médio global", que se situou nos 907 euros.