14.2.08

Empregada "resolve" as desigualdades em casa

Maria João Caetano, in Diário de Notícias

Homens e mulheres não querem abdicar da carreira nem da família


Se a conciliação entre o trabalho e a família é um problema que atinge a maioria das famílias portuguesas, a contratação de uma empregada parece ser a solução mais ambicionada. Pelo menos entre os casais da classe média. Isto acontece porque, como conclui um estudo coordenado pela socióloga Anália Torres, do CIES - Centro de Investigação e Estudos Sociológicos, homens e mulheres estão igualmente empenhados nas suas carreiras e, simultaneamente, preocupados com a família.

Ninguém quer abdicar de nada, mas o tempo não chega para tudo. "A solução é substituir o nosso tempo pelo tempo de outras mulheres", explica Inês Cardoso, um das investigadoras que participou neste estudo, cujos resultados exploratórios serão apresentados hoje e amanhã, no ISCTE, no seminário internacional "Amar e Trabalhar na Europa".

Em Portugal, "coexistem atitudes contraditórias". Por um lado, a nível dos valores verifica-se "uma tendência modernizante e uma clara adesão à norma da igualdade", acentuada entre os casais mais novos. Todavia, na esfera privada, "permanecem as práticas ainda muito marcadas por uma acentuada assimetria de género", ou seja, continuam a ser as mulheres as mais sacrificadas com o trabalho doméstico e o cuidado dos filhos. Isto "reflecte as contradições entre um padrão de emprego feminino a tempo inteiro e as frágeis estruturas institucionais de apoio às mães trabalhadoras", diz o estudo.

Mas o curioso é que à pergunta "se pudesse o que mudaria relativamente às tarefas domésticas", a maioria das respostas vai no sentido de tentar arranjar uma empregada e muito menos no sentido de os homens ajudarem mais. "À medida que os recursos aumentam, o recurso a uma empregada acaba por ser a solução mais viável", explica Inês Cardoso. Não por acaso, diz o estudo, são as mulheres "profissionais intelectuais e científicas" que se mostram "saturadas e sufocadas com o que a vida conjugal implica: as responsabilidades profissionais, conjugais e familiares", o que se deve em parte a uma maior exigência e maiores expectativas "por parte das mulheres licenciadas de uma maior igualdade e paridade no trabalho não pago, que não se efectivou, ou pelo menos não na dimensão que esperavam."

Nas classes mais baixas e nos casais mais velhos, acrescenta Inês Cardoso, "não chega a existir conflito porque, apesar de a assimetria ser maior, existe uma maior incorporação dos modelos tradicionais, homens e mulheres representam o papel que acham que é legítimo, não questionam tanto." Mesmo que, entre os homens, haja algum sentimento de culpa por não "ajudarem" tanto, acabam por se resignar.