25.5.08

Crise alimentargera pobreza

Nuno Veiga/LUSA, in Jornal de Notícias

Em Portugal, começamos a ter consciência da importância da soberania alimentar perdida


O Parlamento Europeu pede aos 27 países da União Europeia que cooperem com o Programa Alimentar Mundial no combate à fome, face ao aumento dos preços dos bens alimentares. O texto sublinha que 75% da população pobre a nível mundial vive em zonas rurais, mas que apenas 4% da Ajuda Pública ao Desenvolvimento é consagrada à agricultura. Por isso, os eurodeputados pedem à Comissão Europeia e aos estados-membros que apostem no sector da agricultura nas suas políticas de desenvolvimento.

A cada vez mais extensa crise alimentar é um grande desafio, talvez o maior, que o Mundo tem de enfrentar actualmente. Como diz o director executivo da Oikos - Cooperação e Desenvolvimento, João José Fernandes, "os motins de fome em África, Ásia e América Latina surpreendem-nos à hora dos telejornais. A onda de choque atingiu os Estados Unidos, com uma corrida desenfreada aos hipermercados com medo da escassez".

Em Portugal, lembra João José Fernandes, "começamos a ter consciência da importância da soberania alimentar perdida. Afinal, a agricultura ainda é necessária no Portugal do séc. XXI!". E interroga "Será a actual crise tão inesperada?". Responde: "A subida de preços era, há muito, previsível. O crescimento demográfico, a crescente procura de alimentos na Índia, na China e em outras economias emergentes, as alterações climáticas, a aposta nos biocombustíveis, a subida dos factores de produção - combustíveis e fertilizantes - são elementos que, conjugados com o desinvestimento na agricultura familiar, a concentração do investimento na produção de empresas transnacionais do sector agro-alimentar, a especulação financeira em torno do mercado de futuros, inevitavelmente causariam uma subida sustentável nos preços dos alimentos".

Se é verdade que o mercado é o sistema que mais incentiva a criação de riqueza, através do estímulo à produção e consumo de bens e serviços, não é menos verdade que pode fundar-se na competição, beneficiando os fortes e prejudicando os fracos. Quando não é regulado, tende a agravar as desigualdades sociais. São os pobres quem mais perde.