21.7.08

Garantias de ministro não convencem ciganos

Nuno Miguel Ropio, Teixeira Correia, in Jornal de Notícias

Nascida em Portugal há 23 anos, só ontem Nádia Cruz conseguiu pela primeira vez obter o título de residência em território nacional.

A jovem era apenas uma entre os 40 habitantes da Cova da Moura, na Amadora, que receberam aquele documento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), através do programa "SEF em Movimento". A iniciativa destina-se a pessoas com mobilidade reduzida ou a mães com filhos pequenos que tenham dificuldade em deslocar-se aos serviços e consiste numa carrinha, com técnicos do SEF, que trabalham em parceria com as instituições locais. "Tenho dois irmãos mais velhos mas, como nasceram antes de 1980, são portugueses. Pelos vistos, só eu é que não tive essa sorte", lamentou Nádia Cruz.

Em dois anos, o projecto "SEF em Movimento" já permitiu a legalização de duas mil pessoas, sobretudo brasileiros, a comunidade mais numerosa em Portugal, adiantou o director-geral do SEF, Manuel Palos. Os cabo-verdianos e indianos são os que se seguem no ranking dos pedidos de títulos de residência.

O programa começou por ser aplicado em jovens institucionalizados, na sequência de uma parceria com o Instituto de Reinserção Social, e alargou-se depois a vários pontos do país onde há uma forte presença de cidadãos estrangeiros.

Se, na primeira deslocação, à Cova da Moura, há cerca de ano e meio, apenas 15 pessoas requisitaram o apoio do "SEF em Movimento", neste momento - uma vez de dois em dois meses - os serviços móveis são procurados por mais de 40. No bairro, tanto os moradores como o SEF têm contado com a ajuda da associação Moinho da Juventude, seja neste programa, seja em sessões de esclarecimento da população como a que ontem decorreu sobre o tráfico de seres humanos, no último piso das instalações daquela associação, com a presença do ministro Rui Pereira. "Os cabo-verdianos e os são-tomenses são os que mais nos procuram, para serem encaminhados para o programa. Recentemente, surgiram ucranianos", elencou Anabela Rodrigues, dirigente do Moinho da Juventude.

O ministro da Administração Interna bem prometeu segurança reforçada na Quinta da Fonte, em Loures. Mas, ontem, na primeira deslocação dos líderes ciganos ao bairro após os conflitos, os ânimos estiveram exaltados.

Os moradores apontam o dedo à Câmara Municipal de Lisboa (CML), que acusam de não lhes dar satisfações, e queixam-se de agora não poderem entrar nas suas casas sem autorização da Protecção Civil, quando, segundo Marta Santos, neta de uma das três idosas desalojadas, já terão entrado no edifício várias vezes desde o incêndio para recuperarem alguns bens.

Sem previsão para o regresso a casa ou para a recuperação do edifício, os moradores uniram-se e garantem que, depois de avaliados os estragos, irão mover dois processos em tribunal: um contra a Câmara e outro contra o proprietária do número 23 - a Junta de Freguesia de Galveias, no Alentejo - onde deflagrou o incêndio. Para já, a única informação que dispõem é que a Junta de Galveias accionou o seguro para a construção de uma cobertura provisória.

António Ramalho, morador no 5º andar direito, confessou ao JN sentir-se um "bocado desprezado" ao ver vedada a entrada na sua casa, de onde ainda não conseguiu retirar os livros que escaparam à água e às chamas, nem avaliar os prejuízos que teve. E apelida de "vergonha" o relatório elaborado pela autarquia: "da vistoria ao 5º esquerdo disseram que não devia lá morar ninguém porque não se via nenhuma mobília. Ora, se aquilo ardeu tudo, o que lá estava ficou calcinado", contou.

Marta Santos também se queixa da falta de consideração da Protecção Civil, para com a sua avó, de 80 anos. "No último dia em que foram ao prédio, não nos disseram nada. Soubemos pela televisão. A minha avó ficou aflita e achou que a casa dela tinha caído e por isso não a avisaram para ir...". O JN, tentou, sem efeito, ouvir o proprietário do prédio.

Ontem, durante uma visita à Cova da Moura, na Amadora, Rui Pereira, mostrava-se confiante de que o regresso da comunidade cigana à Quinta da Fonte estaria assegurado "nas próximas horas". E adiantava que os relatórios do contingente policial, que está há uma semana no bairro, garantiam a segurança do regresso da população. "Espero que entre hoje [ontem] e segunda-feira a situação evolua", disse Rui Pereira.

Contudo, ao início da tarde, a recepção da comunidade africana aos ciganos que, fortemente escoltados pela polícia, se deslocaram pela primeira vez às suas casas vandalizadas, não poderia ter sido pior. Assobios, ameaças de morte e apedrejamentos acompanharam os chefes das 53 famílias ciganas que, desde o dia 17, estão a pernoitar em frente ao edifício da Câmara de Loures.
José Fernandes, porta-voz da comunidade, garantiu que o número de habitações pilhadas aumentou, cifrando-se agora em 34. "Afinal, não há segurança nenhuma. Não podemos voltar a um bairro onde, nem com polícia, podemos estar descansados", atirou.

As ameaças à integridade física acentuaram-se quando jovens africanos se aperceberam da presença do advogado que representa os ciganos, Carlos Caria. "Tivemos de nos enfiar nos carros e sair dali para fora", descreveu ao JN. Segundo o advogado, durante a madrugada, nem a PSP se livrou de ser apedrejada quando uma falha de electricidade provocou um enorme apagão na Apelação, que durou várias horas. Na noite de anteontem, vários moradores queixaram-se do som de um disparo que percorreu o bairro.

Recusando utilizar as cinco tendas montadas pelo Exército num terreno lateral ao bairro, as famílias ciganas prometem não arredar pé do jardim em frente à Câmara de Loures. Ontem, durante algumas horas, a água deixou de correr nos bebedouros que têm sido utilizados pelas famílias.

João Pedro Domingues, vereador da Habitação, garantiu, ao JN, que, a ter havido corte de água, não foi da responsabilidade do município. "Devo relembrar que, se quiséssemos aquelas pessoas fora dali, bastava activar os meios legais, já que não se trata de nenhuma manifestação para a qual tenha sido pedida autorização", disse, voltando a reafirmar que a única solução para as famílias passa pelo regresso integral da comunidade ao bairro.

Para o final do dia de hoje está agendada uma marcha pela Paz, que contará com a presença da governadora civil de Lisboa, Dalila Araújo, e de outras personalidades públicas que querem, com esta iniciativa, aproximar as duas etnias desavindas. Um objectivo que não se afigura fácil, dados os desentendimentos que duram há cerca de oito anos.

"A senhora governadora civil deveria ir ao bairro durante o dia, como nós fomos, e não andar com estes 'fait-divers' [pormenores]", defendeu Carlos Curia, aguardando que o Governo e a Câmara assinem um documento, proposto pelos desalojados, responsabilizando-se por tudo o que venha a ocorrer aos ciganos caso decidam mesmo regressar ao bairro.

Terminou ontem em S.Teotónio a FACECO, feira de actividades económicas de Odemira, que foi visitada por 28 mil pessoas, número inferior ao do ano passado devido à doença da Língua Azul que obrigou a que a feira não tivesse gado ruminante.

Apesar de ter existido menos gente a visitar a feira, António Camilo, presidente da Câmara de Odemira, garantiu ao JN que a feira "foi melhor do que seria expectável, face à inexistência de bovinos", sector que considera valer "um terço das entradas na feira". A ter existido gado ruminante, o autarca não tem dúvidas de que os 35 mil visitantes do ano passado "teriam sido ultrapassados". "O balanço é positivo, face às vicissitudes", disse.

Para precaver situações como as que ocorreram este ano - houve três explorações agrícolas contaminadas, pelo que foi decidido tirar os animais da feira - António Camilo explicou que "em 2009 vão surgir dois certames: o actual de Verão e outro no Inverno", onde estará o gado e os restaurante da região, com peixe e marisco.

O autarca quer "fazer da FACECO o grande certame do Litoral Alentejano", abrindo a porta aos concelhos limítrofes, e "trazer o comércio tradicional de cada localidade do concelho". Face à situação registada, a autarquia e a Associação de Criadores Limousine já decidiram que vão realizar, no último trimestre deste ano, os concursos e leilões de gado que ficaram por realizar.