22.10.08

Elevada desigualdade de rendimentos mantém-se

Isabel Leiria, in Jornal Público

Taxa de pobreza aumentou nos últimos anos na maioria dos países da OCDE. Portugal foi uma das excepções à regra


Portugal é um dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) onde as diferenças de rendimentos são mais acentuadas e onde a situação não se alterou entre meados dos anos 90 e 2004. O fosso entre os mais ricos e os mais pobres nas 30 nações da OCDE é superior apenas no México e na Turquia. Contudo, de acordo com o relatório da OCDE Crescimento Desigual?, ontem divulgado, aqueles foram os únicos países a registar uma "diminuição significativa" das desigualdades de rendimentos, medido através do coeficiente de Gini (ver gráfico).
Esta é, aliás, uma das grandes conclusões do estudo da OCDE: nas últimas duas décadas, houve um aumento "moderado mas significativo" das desigualdades, que atingiu dois terços dos Estados da OCDE. Finlândia, Nova Zelândia, Canadá, Alemanha, Itália, Noruega, Suécia e EUA foram os países onde mais se agravaram.

A evolução deve-se sobretudo ao facto de os agregados familiares mais ricos terem melhorado a sua situação em comparação com as famílias de classe média e baixa. No caso de Portugal, o relatório conclui que houve uma melhoria da distribuição entre a década de 70 e 80, seguida de um aumento "significativo" das desigualdades na primeira metade da década de 90 e uma estagnação nos dez anos subsequentes (o último ano de referência é 2004).

Para além da distribuição dos rendimentos, a OCDE olha para a evolução das taxas de pobreza e conclui que também houve uma degradação deste indicador, com o aumento do número de pessoas pobres (com rendimentos inferiores a 50 por cento da mediana de cada país) a atingir igualmente dois terços dos países.

Portugal é aqui uma das excepções à regra, já que, a par da Grécia, viu a taxa de pobreza "diminuir ligeiramente" entre meados dos anos 90 e 2004. A situação só evoluiu mais favoravelmente na Itália, México e Reino Unido. Este foi um dos aspectos sublinhado ontem pelo ministro do Trabalho e da Solidariedade, Vieira da Silva, que lembrou que os dados mais recentes da União Europeia (até 2006) mostram Portugal como o país que mais reduziu a taxa de pobreza nos últimos anos.

Crianças mais vulneráveis

A situação é particularmente preocupante ao nível da pobreza infantil - que aumentou e está agora acima da média para toda a população da OCDE -, levando a organização a advertir para a necessidade de políticas que dêem "mais atenção" a este grupo. Jovens adultos e famílias com crianças viram também aumentar o seu grau de vulnerabilidade.

Em contrapartida, a taxa de pobreza entre os mais idosos caiu, incluindo em Portugal (menos 1,1 pontos percentuais do que em meados dos anos 90). Já em relação às crianças, as contas da OCDE apontam para a manutenção, em 2004, nos 17 por cento, contra 12 por cento de média na organização.

Para Lino Maia, presidente da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, o relatório evidencia uma situação "injusta e imoral", que obriga a adopção de uma "nova política salarial", com mais rendimentos para os que ganham menos.

Este é também um dos caminhos sugeridos pelo estudo. "A única forma sustentável de reduzir a desigualdade é travar o desfasamento de salários e rendimentos de capital. É preciso garantir emprego e salários que permitam às pessoas manter-se fora da pobreza", lê-se na síntese do relatório.

O documento revela ainda outros dados que colocam Portugal numa situação comparativamente pior, nomeadamente quanto à satisfação de necessidades básicas. Um quarto dos agregados tem dificuldades a este nível, contra uma média de 11 por cento na OCDE. Outro indicador revela que 59 por cento das famílias portuguesas não têm possibilidade de passar uma semana de férias fora de casa, algo inacessível para um terço dos agregados na OCDE.