25.10.08

Europa dá sinais de entrar em recessão profunda

Sérgio Aníbal, in Jornal Público

Os indicadores de ontem desfizeram as dúvidas. "Severa", "persistente" e "profunda" são os adjectivos utilizados para classificar a travagem das economias


Depois da crise financeira, está instalada a temida recessão económica. Durante o dia de ontem, tornaram-se ainda mais claros os sinais de uma quebra repentina na actividade económica um pouco por todo o planeta, agravando-se o receio de que os problemas que se têm vivido no sistema financeiro já sejam o suficiente para que, apesar da forte intervenção estatal, se venha a assistir a um período longo de crise na economia real.

Resultado imediato: no 79º aniversário da quinta-feira negra de Wall Street em 1929, as bolsas mundiais ficaram novamente à beira de um ataque de nervos. As maiores perdas registaram-se na Europa, precisamente o continente onde os sinais dados pela economia foram, ontem, mais negativos e conclusivos.

O indicador de expectativas junto dos gestores das empresas da Zona Euro calculado pela Markit - e que é considerado como um dos dados mais rápidos a identificar a tendência da actividade económica na região - registou, em Outubro, a maior quebra mensal desde o 11 de Setembro de 2001, quando ocorreram os ataques terroristas em Nova Iorque. Mais especificamente, no sector industrial, a evolução da actividade, baseada em indicadores como o número de encomendas realizadas, foi a mais negativa desde que este indicador é calculado, há quase 10 anos atrás.

De forma unânime, os analistas económicos, ontem citados pelas agências noticiosas internacionais, consideravam este indicador como a prova mais sólida até agora apresentada de que a economia da Zona Euro já está em recessão técnica (dois trimestres consecutivos de contracção da economia). E alguns iam mais longe. "O que aqui vemos é muito pior do que uma recessão técnica", afirmou o economista chefe da Markit, a entidade que recolhe os dados.

Fora da Zona Euro, o cenário não é melhor. No Reino Unido, o banco central revelou que a economia registou, no terceiro trimestre deste ano, a primeira contracção dos últimos 16 anos, com o PIB a diminuir 0,5 por cento. O resultado foi pior do que o esperado pela generalidade dos analistas, que agora não têm dúvidas que, até ao final do ano, a economia britânica entrará em recessão técnica. O próprio ministro das Finanças não tem ilusões. "É óbvio agora que a nossa economia e outras economias no mundo estão a encaminhar-se para a recessão", disse ontem.

Nos Estados Unidos, não foram ontem divulgados indicadores económicos relevantes, mas as dificuldades reveladas em muitas empresas, especialmente do sector automóvel, e a perspectiva de cortes nos postos de trabalho ajudaram a acentuar a sensação da inevitabilidade de uma recessão económica grave.

"Recessão profunda"

É por causa destes números que as projecções económicas de várias entidades internacionais estão a ficar cada vez mais sombrias. O economista-chefe da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), Klaus Schmidt-Hebbel, afirmou ontem que "o actual congelamento dos mercados financeiros e de crédito pode demorar mais tempo a resolver-se, com efeitos mais severos no consumo, produção e emprego". "Isto pode levar a uma recessão mais persistente e profunda".

Não é, por isso, de espantar que se multipliquem as medidas de combate à crise tomadas por governos e bancos centrais. Até agora, a prioridade tem sido evitar o colapso do sistema financeiro e desbloquear o mercado de crédito. Esta tarefa ainda não está concluída, mas, brevemente, os Estados podem ser chamados a outro tipo de intervenções, nomeadamente no mercado cambial. Durante o dia de ontem, em resposta aos indicadores económicos divulgados, o euro e o iene caíram de forma brusca face ao dólar e a instabilidade fez-se sentir em várias divisas periféricas.

Mas, para já, o que se espera, especialmente depois dos dados negativos de ontem, é uma nova descida das taxas de juro dos bancos centrais, incluindo o da Zona Euro. Durante o dia de hoje, vários responsáveis do BCE fizeram questão de sinalizar uma redução do preço do dinheiro já na próxima reunião do Conselho de Governadores, agendada para 6 de Novembro. O mesmo deverá acontecer no Reino Unido e nos Estados Unidos. A aposta dos analistas vai para um corte de meio ponto percentual nas principais taxas de referência, tal como aconteceu há cerca de duas semanas atrás.