14.12.08

Plano anticrise é positivo, mas incompleto e obriga a um reforço orçamental

João Ramos de Almeida, in Jornal Público

As associações empresariais da construção aplaudem. Mas o pacote de medidas aprovadas pelo Governo não reúne o consenso de especialistas, sindicatos e oposição parlamentar


Um plano positivo, mas tardio, dependente do investimento privado e com uma dimensão que obrigará a uma revisão do Orçamento do Estado para 2009. Esta é a síntese das reacções dos economistas e especialistas contactados pelo PÚBLICO sobre o plano de 29 medidas aprovado em reunião extraordinária de Conselho de Ministros ontem de manhã.
As associações empresariais da construção aplaudiram, as centrais sindicais deram um apoio condicionado e a oposição parlamentar criticou o atraso na sua apresentação.
O pacote anticrise (chamado "A iniciativa para o investimento e o emprego") foi anunciado apenas depois de o Conselho de Ministros da União Europeia ter dado "luz verde" a um plano para a crise, no valor global de 200 mil milhões de euros, cerca de 1,5 por cento do PIB dos Vinte e Sete.

"Não tinha sentido que Portugal fosse o único" a apresentar um plano e, por isso, decidiu-se fazê-lo agora "articulado com outros países", justificou o primeiro-ministro José Sócrates. O Governo quer investir 2180 milhões de euros (1,25 por cento do PIB). Desses, 1300 milhões serão recursos nacionais do Orçamento do Estado de 2009 (0,8 por cento do PIB). Os restantes 880 milhões serão pagos por recursos comunitários.

O pacote é repartido por 500 milhões para a modernização e recuperação de escolas, 250 milhões de euros para investimento energético, 50 milhões para redes de banda larga, 800 milhões para incentivo à economia e 580 milhões para apoio ao emprego.
Na conferência de imprensa após a reunião do Governo, o primeiro-ministro garantiu que as medidas representam um "esforço suplementar" ao do OE de 2009 - apoio à banca, crédito bonificado de 3150 milhões de euros às Pequenas e Médias Empresas, pagamento das dívidas do Estado, financiamento de 1250 milhões de euros às regiões autónomas e um conjunto de investimentos públicos (TGV, infra-estruturas rodoviárias, barragens). E que por essa razão o défice orçamental subirá dos previstos 2,2 para 3 por cento do PIB.

Mas ficou por explicar de que forma o plano será financiado. Será por recurso à emissão de dívida pública? E, nesse caso, o limite aprovado para 2009 é suficiente? Serão as medidas de apoio ao emprego pagas pelo Estado ou pelos recursos da Segurança Social? O Governo nada disse.

O impacto das medidas foi todavia relativizado pelos próprios membros do Governo. Quando questionado se seria suficiente para evitar a recessão técnica que se antevê já para o final de 2008, José Sócrates não respondeu. Repetiu apenas que as medidas são de uma "enorme importância" e remeteu para a revisão do Programa de Estabilidade e Crescimento, que será apresentado "em breve" na Assembleia da República. De igual forma, o ministro do Trabalho, José António Vieira da Silva, frisou que as iniciativas sociais visam, sobretudo, "prevenir e agir por antecipação" dado o risco de uma subida do desemprego.

Mas o plano recebeu reacções distintas. Os especialistas ouvidos pelo PÚBLICO (ver págs. 4-5) consideram que, em geral, as medidas vão no bom caminho, embora ponham reservas à eficácia de algumas delas.

No mesmo sentido vão as duas centrais sindicais. A CGTP considera as medidas "prioritárias", mas o seu secretário-geral, Carvalho da Silva, questiona a sua eficácia sem fiscalização, definição de critérios, prazos de aplicação, salvaguarda do emprego por parte das empresas e a garantia de que se chegue às pequenas empresas. As reservas da UGT centram-se, sobretudo, na falta do fomento ao consumo interno, através do aumento dos salários e pensões.

Os dirigentes empresariais, designadamente ligados à construção, mostraram-se satisfeitos com o pacote e com a revisão do défice orçamental para 3 por cento do PIB. A CIP elogiou o aumento de crédito às exportações e às PME, mas questiona-se se será suficiente.

A oposição parlamentar foi bastante crítica e unânime a atacar o atraso do plano, bem como a demagogia do Governo por ter recusado no passado medidas agora adoptadas. O PSD criticou a falta de medidas fiscais e a de uma maior redução da taxa social única. O PCP alertou para o risco de um orçamento rectificativo e a falta de aumento de salários e pensões. E o Bloco de Esquerda acusou o Governo de "continuar a lançar dinheiro sobre o país", como fez com a banca, sem acautelar uma política de incentivo eficaz de emprego.

2180 milhões é o valor em euros do pacote anticrise aprovado ontem pelo Governo em reunião extraordinária