21.12.08

Sobreendividados que ganham menos voltam rapidamente a recorrer ao crédito

Ana Rita Faria, in Jornal Público

O cenário é aparentemente contraditório. De acordo com o estudo liderado por Catarina Frade, a grave situação financeira que os sobreendividados atravessam, e que tem muito a ver com as dívidas de crédito contraídas, faz com que a maioria ganhe aversão ao crédito. De um total de 1730 inquiridos, 40,9 por cento afirmam que, se fosse hoje, não voltariam a recorrer ao crédito e 22,9 por cento sustentam que só voltariam a contraí-lo se não tivessem outra alternativa. Assim sendo, independentemente da idade, habilitações literárias ou estado civil, a esmagadora maioria afirma que não voltaria a contrair crédito.

No entanto, o cenário muda de figura quando se analisa o grau de aversão ao crédito em função dos rendimentos das pessoas. Quem ganha menos - entre 376 e 500 euros ou abaixo dos 376 - garante que voltaria a recorrer ao crédito, como forma de compensar os seus baixos rendimentos.

Para Catarina Frade, esta tendência de sobreendividamento social é "preocupante" e obriga a que se criem novas lógicas de conceber e conceder crédito, que encarem a falta de acesso a este financiamento como um factor de exclusão social.

Segundo a investigadora, uma solução possível para uma parte dos sobreendividados seria "a existência de instituições financeiras ou produtos financeiros especializados no crédito social para grupos de maior risco", já ensaiada em alguns países europeus, como é o caso da Bélgica.

Outro aspecto revelado pelo estudo do OEC e considerado preocupante é a importância que factores como a publicidade e a acessibilidade têm na escolha do crédito, em detrimento da análise das condições oferecidas.

Dos cerca de 1500 inquiridos a este respeito, 46,1 por cento revelam que a escolha da entidade de crédito se deveu à publicidade feita. Por sua vez, 28,2 por cento referem que a opção se deveu ao facto de aquela ser a entidade que oferecia crédito na loja onde efectuaram a aquisição do bem. Apenas em terceiro lugar, com 23,6 por cento, surge a escolha associada à melhor proposta de crédito.

Para Catarina Frade, estas afirmações revelam um "comportamento de risco", traduzido na "pouca apetência das pessoas pela prospecção do mercado na procura da melhor proposta de crédito para o seu perfil".

Renegociar dívidas é outro dos campos onde as coisas parecem não correr bem para os sobreendividados. Cerca de 1160 pessoas que recorreram à Deco admitiram ter tentado fazê-lo directamente junto dos credores. Os resultados foram desanimadores. Cerca de 660 inquiridos revelam não ter tido qualquer sucesso nas negociações, uma vez que nenhuma entidade aceitou os termos propostos pelo devedor.

Catarina Frade chama aqui a atenção para a falta de mecanismos institucionais credenciados que estejam aptos a intervir na mediação de dívidas entre consumidores sobreendividados e credores. "Há empresas de consultoria financeira que, por vezes, não são mais do que entidades que angariam novos créditos", explica a investigadora. É, pois fundamental, procurar "entidades idóneas, imparciais e independentes".