30.12.08

Vaclav Klaus vê ao espelho um dissidente europeu

Dulce Furtado, in Jornal Público

Aquilo que os analistas apontam ao Presidente da República Checa - um político temerário e provocador, com opiniões amiúde contrárias à corrente -, o próprio Vaclav Klaus afirma sem hesitações: "Sou um dissidente europeu."

Fundador do principal partido de direita do país, o Partido Cívico Democrático (ODS), Klaus lançou mão de toda a sua influência contra o Tratado de Lisboa, por ratificar no Parlamento checo. Vê-o como uma ameaça à soberania do país e avisou que só assinará o documento se a Irlanda - que votou contra o tratado em referendo - inverter curso no voto que deve realizar-se no fim de 2009.

O atribulado encontro de há três semanas de Klaus com o co-presidente do grupo dos Verdes no Parlamento Europeu, Daniel Cohn-Bendit, em Praga, é elucidativo daquilo que temem as instituições comunitárias com a bem próxima presidência checa da União Europeia - a qual Vaclav Klaus acusa de "défice democrático" e de excessos burocráticos e de regulamentação supranacional.

O londrino Daily Telegraph descreveu a conversa entre os dois políticos como "pouco educada". De acordo com a transcrição emitida pelo Castelo de Praga - residência oficial do Presidente checo -, Cohn-Bendit iniciou o diálogo com uma oferta: "Trouxe-lhe uma bandeira." Era uma alusão à obstinada recusa de Klaus em içar ali a bandeira da União Europeia.

Economista, de 67 anos, com carreira no Banco Estatal da Checoslováquia na década de 1970 e a maior parte da de 1980, depois dos estudos que incluíram estadias em Itália e nos Estados Unidos, Klaus entrou na política com a Revolução de Veludo, de 1989. Foi um dos protagonistas da passagem do seu país à economia de mercado, após a queda do regime comunista, como ministro das Finanças (1989 a 1992) e como chefe do Governo (1992 a 1997). Nesse período, presidiu à separação da Checoslováquia nas repúblicas da Eslováquia e Checa.

O seu executivo ruiu com um escândalo financeiro no seio do ODS, passando então a liderar, a partir de 1998 e até 2002, a Câmara dos Deputados. Mas o ano seguinte seria para ele um ano de relançamento político: assume a presidência do país após uma eleição indirecta muito difícil, sucedendo ao humanista e pró-europeísta Vaclav Havel. Em Fevereiro foi reeleito, sem pompa.

Confesso admirador da britânica Margaret Thatcher, a Dama de Ferro, e adepto das teorias liberais do monetarista Milton Friedman, Klaus é de há muito defensor das "liberdades individuais" e um crítico feroz dos "alarmistas" ambientalistas, que diz estarem mais motivados pela ideologia do que pela ciência.

Publicou recentemente em inglês o livro Blue Planet in Green Shackles (que pode traduzir-se por Planeta Azul em Grilhões Verdes), onde contesta os "mitos do aquecimento global" e denuncia o que designa como uma "histeria" dos ambientalistas. Estes, afirmou publicamente, constituem um entrave às liberdades individuais como antes o foram os comunistas.

"Vaclav Klaus é uma pessoa a que só muito dificilmente se é indiferente. Não é o tipo de pessoa sobre quem não se tem opinião", sublinhava à REL/RL o politólogo checo Petr Drulak, do Instituto de Relações Internacionais de Praga. É também um político com um prazer especial no confronto: "Gosta de discussões intelectuais, nas quais se comporta de forma relativamente - talvez mesmo extremamente - agressiva", descreve o analista.