30.1.09

Não são só os pobres que vão ao prego

Ilídia Pinto e Márcio Alves Candoso, in Diário de Notícias

Perde-se no tempo a memória da actividade de emprestar dinheiro tomando como garantia um objecto. As casas de penhores - ou prestamistas, como a maioria gosta de ser conhecida - tentam fugir da má-fama que se lhes colou à pele desde há muito. E, por isso, os mais profissionais estão actualmente a reciclar todo o processo de negócio.

Uns dizem que os tempos já foram melhores. Outros reconhecem que a crise vai trazer clientes. Vários queixam-se da concorrência das casas que compram, em vez de emprestar. Dizem que os particulares que recorrem às primeiras normalmente não fazem bom negócio. No Porto e em Lisboa, o DN foi à procura de uma profissão antiga. Tão antiga como a pobreza.

João (nome fictício, já que prefere não ser identificado com me- do de ser assaltado), tem 70 anos e dedicou 45 deles a esta actividade. Tem loja no Porto e diz que o negócio "está mau". Acredita que a decadência da actividade prestamista está directamente relacionada com o fim do monopólio que existia dantes e com a concomitante proliferação de lojas e ourivesarias que compram ouro usado e cautelas de penhor. "Em vez de penhorarem as jóias, as pessoas vão directamente vendê-las", critica.

A mesma visão tem Paulo Paixão, de 35 anos, director-geral da Casa de Crédito Popular (CCP), uma rede de 12 lojas na área de Lisboa e Algarve. "Não aconselhamos ninguém a vender, porque para além do eventual valor afectivo do objecto [jóia], temos a noção de que o mercado não está a dar mais pela venda do que aquilo que nós proporcionamos a título de empréstimo", afirma.

Nem todas as casas de penhores que o DN visitou se assemelham entre si. O tom lúgubre de umas e o aspecto arejado de outras marcam, provavelmente, o contraste dos modelos de negócio que lhes subjazem. Mas todas têm um retrato comum: a ansiedade dos clientes antes do processo negocial e o relativo desafogo que demonstram quando saem (ver texto na página seguinte).

Paulo Paixão é de opinião que o negócio "está igual ao que era há dez anos". "Houve a certa altura a ilusão de que estava a crescer, mas isso deve-se ao fecho das lojas, em número de 72, que a Caixa Geral de Depósitos tinha em todo o País, e que fecharam há dez anos", explica. Também o Montepio Geral, que era o outro banco que tinha serviço de penhores, fechou a actividade, embora mais recentemente.

Isso fez com que nos últimos anos "houvesse um crescimento do número de lojas, que deverão hoje em dia ser umas 60 em todo o País", explica o mesmo responsável. Metade delas são na região de Lisboa. Paulo Paixão trabalha numa empresa que, ela própria, foi fundada por ex-fun- cionários da CGD que pertenciam ao serviço entretanto extinto.

No entanto, há opiniões para todos os gostos. Manuel Aleixo, 82 anos - 70 dos quais a trabalhar na Companhia União de Crédito Popular, no Porto (a empresa foi fundada em 1875) - admite que a "indústria está em crescimento. "Há mais clientes, diz, "é natural porque também há mais pobreza".