28.1.09

Pobreza não é sinónimo de delinquência

in Jornal de Notícias

Manuel Lopes Madeira Pinto, juiz-desembargador no Tribunal da Relação do Porto e especialista em Direito de Família e Menores


O director da PJ-Porto fala num aumento de criminalidade juvenil. Poderemos estar perante uma alteração do quadro sociológico da deliquência de menores?
Não creio. Esse aumento da criminalidade juvenil acompanha proporcionalmente o aumento da criminalidade em geral. Muitos jovens delinquentes integram-se ocasionalmente em bandos organizados para a prática de crimes.

Há situações menos vulgares em que esses jovens integram gangues organizados com a intenção deliberada de servirem de "bodes expiatórios", assumindo as autorias dos crimes e desculpabilizando membros do grupo adultos. As causas dessas situações que importam intervenção judicial têm génese na degradação das famílias, ligadas a marginalização e degradação moral dos seus membros. Não é a pobreza que gera necessariamente estes fenómenos, podendo seguramente potenciá-los. Ser pobre não é sinónimo de ser delinquente.

Existe trabalho junto da família do jovem delinquente? O que poderia ser feito a nível preventivo?

A nível de prevenção da delinquência juvenil, a intervenção caberá às escolas, ao nível educacional, devendo existir ao nível curricular do ensino básico disciplinas referentes a Civilidade e Direitos e Deveres Fundamentais do Cidadão, e aos organismos de assistência social e às autarquias, fomentando políticas de apoio à integração social da juventude e de apoio ao desporto e actividades culturais e lúdicas. Gasta-se tanto dinheiro em infra-estruturas, essencialmente ligadas aos transportes! É necessário investir mais nas pessoas.

O Governo já manifestou a intenção de alterar a Lei Tutelar Educativa. Há efectivamente necessidade de alteração?

Na minha opinião apenas deveriam ser feitas ligeiras "melhorias" na Lei Tutelar Educativa ao nível do exercício e manutenção do direito de queixa como pressuposto da intervenção judicial em "crimes" semipúblicos ou particulares, da apensação dos processos àquele onde tenha sido aplicada medida mais grave e da substituição das medidas por outras mais graves.

A idade da imputabilidade (16 anos) é algo a rever?

Não vejo razões de fundo válidas para ser alterada. A insegurança e o alarme social ligados à criminalidade em geral levam alguns "justiceiros" a aplaudirem medidas tendentes a diminuir a imputabilidade penal e agravar as medidas aplicadas. Não creio que tais medidas tenham fundamento real e permitam diminuir a criminalidade juvenil, só por si. É uma discussão semelhante à defesa da pena de morte ou prisão perpétua. Os estados que ainda têm essas penas na lei ou não as aplicam efectivamente ou, pela sua aplicação, não têm melhores resultados no combate ao crime mais grave.