24.2.09

Mudaram-lhe as fechaduras e fez queixa por discriminação

Ana Espada, in Jornal Público

Comprar uma casa exige muitas burocracias, mas é um processo relativamente fácil. Contacta-se com uma sociedade de mediação imobiliária, visitam-se apartamentos, decide-se qual se quer comprar e, posteriormente, assina-se um contrato de compra e venda para adquirir o imóvel. Rui Maia passou por todo este processo para comprar um apartamento na urbanização Colinas do Cruzeiro, em Odivelas, mas no final, e já depois de se ter instalado no imóvel, alegou terem-lhe mudado as fechaduras, impossibilitando-o de usufruir do mesmo. Porquê? O comprador diz que é por ser de etnia cigana.

Rui Maia, talvez por não corresponder ao estereótipo (físico) concebido pela sociedade, não teve dificuldades em adquirir um apartamento num empreendimento de luxo. A urbanização Colinas do Cruzeiro é "uma cidade dentro da cidade", segundo o site do Grupo Obriverca, empresa construtora responsável pelo empreendimento. Rui Maia dirigiu-se à empresa de mediação imobiliária Patrimonium, que trabalha com a construtora, e assinou um contrato promessa de compra e venda.

De forma a poder usufruir do imóvel, fez um aditamento ao contrato e instalou-se. Alguns dias depois, levou familiares a visitar o espaço e foi assim que os vendedores se aperceberam que se tratava de um cidadão de etnia cigana. "Quando chegámos a casa, tínhamos tudo trancado, mudaram as fechaduras", disse Rui Maia, que já apresentou queixa na esquadra de Odivelas da PSP.

José Falcão, dirigente do movimento SOS Racismo, disse que "não é a primeira vez que este tipo de situação acontece", acrescentando que "a lei não permite uma tomada de decisão rápida, que normalmente demora anos".

Em declarações ao PÚBLICO, a Patrimonium disse "não ter praticado quaisquer actos de discriminação", alegando que este caso "tem uma eventual relevância de foro criminal". Para a empresa, tudo não passou de uma tentativa de burla. O comprador ocupa a casa e transforma a vida do prédio num "inferno", levando o empresário a romper o contrato e a pagar uma indemnização ao comprador.

Já o grupo Obriverca afirmou não ter nenhum negócio directo com José Maia, mas confirma que uma sociedade em que detém uma "participação social [a Patrimonium] terá celebrado um contrato com o referido comprador, [e] tal contrato terá sido denunciado pela [sua] participada com justa causa".

José Falcão, do SOS Racismo, considera a lei "bastante demorada" em denúncias de discriminação racial