24.4.09

Instituições dizem que pobreza está a aumentar na região

in Verdadeiro Olhar

De que forma a pobreza tem atingido a população? Foi a essa questão que procuramos dar resposta esta semana. Contactamos diversas instituições e entidades no sentido de perceber se a pobreza está a aumentar na região. Fomos junto das farmácias perceber se há muitos casos de utentes que não podem suportar a conta da receita; falámos com os responsáveis da AMI de Lousada, das Conferências Vicentinas e da Sopa dos Pobres para avaliar se são mais aqueles que procuram ajuda em alimentos e vestuário; ouvimos a Santa Casa da Misericórdia de Penafiel, no que diz respeito aos pedidos de ajuda em refeições domiciliárias; e contactamos as escolas para ver de que forma esta realidade se reflecte no dia-a-dia dos alunos.

Dos dados recolhidos podemos inferir que os casos da designada pobreza escondida, de famílias que lutam com dificuldades financeiras para cobrir as suas despesas ao fim do mês, ter alimentos para comer e dinheiro para se vestirem, estão a aumentar.

Segundo um estudo do Banco de Portugal, divulgado no último Boletim Económico, em 2006, Portugal tinha dois milhões de pobres e destes 15 por cento, ou seja, 300 mil eram crianças. O documento apresenta o desemprego como um dos factores que contribuiu para estes números.

O último estudo relativo à região, "O Impacto do (Des)Emprego na Pobreza e Exclusão Social no Porto-Tâmega", da Rede Europeia Anti-Pobreza, apresentado em Julho de 2008, deu conta de uma situação preocupante, mostrando a existência de mais de 20 mil desempregados e sublinhando que, entre outros, nos concelhos de Lousada, Paços de Ferreira, Paredes e Penafiel se verificou um aumento das situações de pobreza.

AMI: Impotência face à procura por ajuda

Segundo os responsáveis pela AMI de Lousada são cerca de 20 as pessoas que diariamente têm procurado a ajuda da instituição. Os meios da AMI são cada vez mais escassos devido ao número exponencial de pessoas que agora apoiam. Vestuário, confessam, não falta, permitindo-lhes até uma triagem bastante exigente, sendo que apoiam cerca de mil pessoas. Quanto aos alimentos, já não é bem assim. Aparte os cabazes do PCAAC - Programa Comunitário de Ajuda Alimentar a Carenciados que recebe e distribui por cerca de 700 pessoas, a instituição vai dando alguns alimentos que lhes chegam a partir de campanhas de recolha realizadas por escolas e hipermercados, mas confessam estão quase "a zeros". Por isso, apela à ajuda destas entidades no sentido de realizarem novas campanhas. Para entrar nas listas do PCAAC há cerca de 200 pessoas.

"Sentimo-nos impotentes perante tantas dificuldades, queremos dar mais e não temos", confessa o presidente da AMI Lousada, falando num aumento de cerca de 50 por cento na procura por ajuda. Fala em "casos dramáticos e de fome", provocados sobretudo pelo desemprego. Vasco Bessa não esconde que a situação é ainda mais grave do que aparenta devido ao grande número de casos de pobreza escondida.

São cada vez mais as carências e as dificuldades

Maria Alice Ferreira Silva é a presidente da Conferência Vicentina de Santa Teresinha do Menino Jesus, em Castelões de Cepêda. A instituição dedica-se a visitar e dar assistência aos mais velhos, a conversar e, no fundo, "a ajudar no que pode". Aproximar-se das pessoas e avaliar as suas carências acaba por ser o papel das 12 pessoas desta Conferência. Segundo Maria Alice Ferreira da Silva, há muita pobreza envergonhada: "As pessoas aceitam ajuda mas não querem que se saiba", referiu.

São cerca de 15 as pessoas a quem prestam auxílio por mês. Um número não muito significativo mas que faz a diferença já que cada vez são mais notórias as "carências e as dificuldades". As pessoas recorrem muitas vezes à paróquia e é também a paróquia, assim como o subsídio que receberam da Câmara, o apoio da Junta de Freguesia, e o peditório realizado em Outubro, que vai sustentando a instituição.

As causas são sempre as mesmas: desemprego e divórcio. A instituição distribui alguns cabazes em géneros, ajuda a comprar medicamentos, dá também apoio monetário para pagamento de rendas, água e luz (quando têm verbas).

Sopa dos Pobres com acréscimo de procura desde Novembro

O padre Feliciano Garcês assevera que a procura da Sopa dos Pobres tem tido um aumento significativo, designadamente, partir de Novembro de 2008 (actualmente auxiliam cerca de cem pessoas). De acordo com o pároco, a sopa que tem sido oferecida de 15 em 15 dias passará brevemente a ser distribuída todas as quintas-feiras.

De igual modo são ofertados cabazes com alimentos básicos. Actualmente, rondam já à volta de 70/80 cabazes por mês, sendo que cada cabaz garante duas refeições por dia durante mais de uma semana a cada família.

Segundo Feliciano Garcês, as pessoas que procuram ajuda são os idosos, mas também casais jovens e desempregados com filhos. Todavia, não são sempre os mesmos. "Algumas aparecem duas ou três vezes e não vão mais. É um pouco cíclico", afirma. A roupa e o calçado são igualmente muito solicitados, principalmente para crianças. E muitas vezes são os avós que vão pedir, porque os pais têm vergonha. "Não me admira que isto seja a ponta do iceberg", reitera, apontando o desemprego em Espanha como uma das causas que tem conduzido à pobreza na região.
A contrastar um pouco com os restantes dados, o provedor da Santa Casa da Misericórdia de Penafiel, Fernando Moreira Gonçalves, considera que o concelho de Penafiel "não está na lista negra" e que os pedidos de ajuda em refeições domiciliárias têm-se mantido estáveis. Contudo, não deixa de evidenciar alguns "casos de pobreza envergonhada".

Idosos e desempregados com mais dificuldades na compra de medicamentos

Segundo a directora técnica da Farmácia Ruão (Paredes), Patrícia Castro, as dificuldades têm-se agravado, principalmente, desde o início de 2009. Entre 20 e 30 por cento das pessoas (idosos) vão buscar parte da receita e quando puderem vão comprar o resto. "Dizem que tomam dia sim, dia não, de forma à medicação durar mais tempo", sustenta. Os medicamentos menos vendidos são os anti-hipertensores e medicamentos para o colesterol (por serem caros).

A directora técnica-adjunta da Farmácia Moderna (Paços de Ferreira), Mercedes Barros tem uma opinião semelhante. São as pessoas mais idosas que apresentam maiores dificuldades económicas, mas também os desempregados. "Eu até tinha aqui algum dinheiro mas vai-me fazer falta", é uma das frases que ouve com frequência. Também em Penafiel, a directora técnica da Farmácia Miranda, Carminda Borges apresenta-nos uma situação idêntica. Os utentes deixam de comprar os medicamentos para o colesterol (porque não têm efeitos imediatos), contudo continuam a adquirir bombas para asma.

Por seu lado, Cristina Ferreira, da administração da Farmácia Ribeiro, em Lousada, adianta que as pessoas (normalmente os reformados) escolhem os medicamentos principais: para o coração, em casos de sangue gordo e tensões (doenças crónicas). Quando têm uma receita com um xarope e um antibiótico, optam na maioria por levar só o antibiótico. A percentagem de pessoas que aviam medicamentos e pagam é de 50 por cento e representa os idosos. Outros 30 por cento (desempregados, com muitos filhos e muitas doenças) aviam, mas com mais dificuldades. Em muitos casos deslocam-se à farmácia para saber o valor total da receita, mas por falta de dinheiro não compram. Dirigem-se à assistente social para obterem uma ajuda ou pedem a alguém que lhes empreste.

Escolas apresentam realidades distintas
"Há alunos que chegam à escola com fome"


As escolas contactadas apresentam dados distintos e por vezes antagónicos, sendo que para umas os problemas já existiam e não têm aumentado, e para outras a realidade é cada vez mais preocupante e se tem notado um aumento do número de alunos com carências. As discrepâncias podem dever-se à realidade social de cada concelho.

No Agrupamento Vertical Este de Lousada, a vice-presidente, Celina Cardoso, não adiantou muito sobre números, mas não escondeu que "há alunos que chegam à escola com fome", já que muitos têm problemas em casa e não tomam sequer pequeno-almoço. Por sua vez, a psicóloga Ângela Ferreira, do Agrupamento Vertical Oeste, referiu que sempre houve problemas sociais no agrupamento, sendo que medidas de apoio, como o suplemento alimentar, sempre foram usadas. Desde que se fala da crise, referiu, há apenas dois casos novos de alunos com dificuldades.

Eiriz e Frazão com realidades dramáticas

Ana Paula Tato, presidente do Agrupamento Vertical de Eiriz, apresentou uma realidade dramática: "há alunos que só se alimentam aqui na escola". Segundo a professora são entre 30 a 40 casos, um número que tem vindo a aumentar, a quem a escola oferece o pequeno-almoço e o lanche. Para contrariar estas dificuldades o estabelecimento de ensino também organiza campanhas de solidariedade internas para dar cabazes às famílias dos alunos mais carenciados no Natal e na Páscoa, da última vez foram 17.

Ainda em Paços de Ferreira, no Agrupamento Vertical de Frazão, que engloba as "quatro freguesias mais carenciadas do concelho", Manuela Dias garante que a situação tem vindo a piorar e se nota pelo facto de a maioria das crianças ter já escalão A ou B. Se há pais que alertam a escola dizendo que a situação não está muito boa, há mesmo alunos, disse a responsável, "que vão à secretaria pedir um lanche". "Do ano passado para este os gastos no bufete da escola diminuíram para metade", revelou Manuela Dias. Aos casos mais graves, cerca de três a quatro por cento dos 730 alunos da EB 2,3, também esta escola dá lanche e pequeno-almoço.

Em Paredes não se notam tantas dificuldades

Em Paredes a realidade parece ser um pouco diferente. No Agrupamento Vertical de Baltar, António Aguiar adiantou que não se notam muitas alterações à excepção de haver agora mais encarregados de educação a solicitar alterações do escalão. Já Amélia Santos, do Agrupamento Vertical de Rebordosa, referiu que os pais se vão queixando de situações difíceis, mas que não têm notado diferenças de consumo no bar, nem tem havido pedidos para alteração de subsídios.

A presidente do Agrupamento Vertical da Sobreira, Edite Baptista, também defende que não tem havido um aumento notório das dificuldades. Quanto a números, revelou que do ano lectivo transacto para este houve um aumento significativo de alunos com escalão B (de 70 para 226) e uma diminuição dos que tinham escalão A. Já os alunos com suplemento alimentar também diminuiu de 29 para 18.

Até ao fecho da edição não foi possível obter feedback de escolas penafidelenses quanto a esta questão.