22.6.09

Banco Mundial prevê mais desemprego e pobreza nos países em desenvolvimento

Ana Rute Silva, in Jornal Público

O fluxo de capital estrangeiro nas economias mais frágeis deverá cair 48,7 por cento, atingindo os níveis de 2004. O Banco Mundial espera uma contracção de 2,9 por cento do PIB mundial


Desta vez, os países emergentes não vão conseguir amparar a queda das maiores economias do mundo. Depois de um crescimento de 5,9 por cento em 2008, que sustentou o abrandamento dos Estados Unidos no ano passado, a economia das nações em desenvolvimento deve subir apenas 1,2 por cento em 2009.

Tirando a China e a Índia das contas, o PIB destes países deverá cair 1,6 por cento. Com o PIB mundial a contrair-se este ano 2,9 por cento, prevê-se mais desemprego e situações de pobreza, alerta o Banco Mundial, num relatório que será hoje divulgado.
"Esta recessão foi muito simultânea. Esperávamos que estes mercados funcionassem como uma espécie de almofada para os países mais ricos, porque ainda havia crescimento na China ou no Brasil. Mas não foi isso que sucedeu", disse ao PÚBLICO Mick Riordan, economista sénior do Banco Mundial.

Apesar das medidas de estímulo dos Governos terem evitado o colapso sistémico do sector financeiro mundial, ainda não foi possível travar a instabilidade e a recessão. A frágil confiança dos consumidores e a maior aversão ao risco dos investidores dos países desenvolvidos também contribuíram para o declínio na procura global.

Segundo o estudo Global Development Finance, o fluxo de capital privado nas economias emergentes já tinha registado quebras o ano passado (de 1,2 milhões de milhões de dólares em 2007, para 707 mil milhões). Este ano, apesar de se manterem em níveis positivos, os fluxos de capital deverão cair 48,7 por cento, para 363 mil milhões de dólares (cerca de 259,7 mil milhões de euros), próximo dos níveis de 2004. Ou seja, vai ser mais difícil conseguir satisfazer as necessidades de financiamento.

Pelas contas do Banco Mundial, 97 dos 108 países em desenvolvimento analisados vão precisar de crédito na ordem de um milhão de milhões de dólares, mais 600 mil milhões do que na crise de 2003, a preços de 2009.

"Nos países onde não for possível captar financiamento externo, o processo de ajustamento será abrupto (...), implicando um declínio mais acentuado no consumo interno e pressão adicional nas taxas de câmbio", diz o mesmo documento.
A Europa e a Ásia central foram as regiões mais atingidas pela instabilidade dos mercados, sobretudo porque alguns países, quando entraram em crise, já tinham conjunturas desfavoráveis. O défice elevado e os desequilíbrios entre a procura e a oferta tornaram algumas economias vulneráveis à quebra das exportações e de capital estrangeiro.

Em 2009, o Banco Mundial estima que o PIB nestas regiões diminua 4,7 por cento, recuperando 1,6 por cento em 2010.

Mick Riordan diz que esta é uma recessão muito diferente das anteriores. "A crise foi quase simultânea entre os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e os mercados emergentes, e as trocas comerciais entraram em colapso. E é uma crise do sector privado e não do público, da indústria e do sector financeiro", sublinha. A "profundidade" da turbulência global surpreendeu os economistas do Banco Mundial, que, face aos mais recentes indicadores, acreditam que o "princípio do fim" está próximo. Mas deixam um aviso: o mundo está a entrar numa era de crescimento lento que vai exigir mais controlo sobre o sistema financeiro.

"A recuperação vai estar baseada na procura interna dos Estados Unidos, da China e de outros países do Leste asiático. Em 2010, prevemos um crescimento de dois por cento da economia, impulsionado, nomeadamente, pelos pacotes de estímulo e os efeitos da descida da inflação", aponta Mick Riordan.

A A quebra dos indicadores económicos do primeiro trimestre de 2009, face ao período homólogo do ano passado, "foi de tirar a respiração". Mick Riordan, economista sénior do Banco Mundial, admite que as descidas do PIB alemão (de 3,8 por cento no primeiro trimestre) e da União Europeia (de 2,5 por cento no mesmo período) foram "a maior surpresa".

Apesar de algum optimismo - ajudado pelos indicadores de produtividade dos Estados Unidos - Riordan acredita que haverá uma segunda "onda de instabilidade". "O sistema bancário ainda está frágil e a economia real também. A combinação entre os dois é um círculo vicioso", sustenta.

A severidade da crise veio sublinhar a importância dos esforços conjuntos entre os países mais ricos e as economias em desenvolvimento. Para o Banco Mundial, é preciso criar uma rede mais eficiente de suporte ao crescimento sustentável.

Entre as medidas propostas estão uma regulamentação internacional mais rígida, para "evitar riscos excessivos que ameacem a estabilidade", mais recursos para as instituições financeiras de âmbito internacional e a atribuição de maior importância às economias em desenvolvimento na definição da ordem financeira mundial.