22.6.09

Cónego da Sé critica "mentiras" sobre a pobreza

Raul Caires, in Diário de Notícias da Madeira

Manuel Martins conhece mães que enganam a fome dos filhos dando-lhes chá


O cónego Manuel Martins teceu ontem duras críticas à forma como o Governo Regional, nomeadamente através da Segurança Social, vem lidando com a pobreza. Mas foi o 'chumbo' dado pelo PSD/Madeira na Assembleia Legislativa à proposta do Bloco de Esquerda, que propôs a criação de cantinas sociais para ajudar a combater 'pobreza envergonhada', que orientou a denúncia feita pelo sacerdote durante a homilia proferida na Sé Catedral.

"Ouvi notícias esta semana (passada) que o parlamento regional recusou medidas de combate à pobreza, afirmando haver organismos onde podem dirigir-se os pobres", começou por recordar para depois perguntar aos que defendem "tal posição": "Conhecendo como conheço a falsidade de tantas medidas anunciadas de combate à pobreza e situações de miséria e de fome de tantas famílias (...), onde estão esses organismos de ajuda para que eu possa indicá-los aos muitos pobres que diariamente na igreja pedem ajuda". Segundo o sacerdote, existem casos sociais que precisam de ajuda por causa do "desemprego, alcoolismo, droga" e de "famílias jovens que não podem pagar o crédito à habitação" ou o "pão para os filhos". Há também "famílias que têm idosos acamados e doentes, casais que esperam e desesperam meses à espera de uma reunião com os agentes da Segurança Social para pedir ajuda - e são sempre adiadas ou quase sempre", acrescentou. A classe médica também não escapou ao olhar crítico do cónego da Sé, já que este denunciou casos de "reformados que continuam a não receber qualquer ajuda para os medicamentos porque na receita vem a cruzinha da não autorização da troca por genéricos".

O Cónego da Sé continuou, afirmando que "há hoje situações dramáticas de injustiças sociais gritantes que causam tanta indignação que muitas vezes levam-nos à revolta". E esta, explicou, nasce naturalmente "da compaixão do sofrimento dos pobres e do cinismo dos insensíveis".

Para Manuel Martins, face a este cenário é preciso "uma grande dose de bom-senso e de caridade para não nos tornarmos amargos perante tantos anúncios de ajuda aos necessitados que não passam de mentiras descaradas".

"Conheço pessoalmente situações de pobreza extrema e de fome", afirmou, apontando casos de "mães que para enganar a fome dos filhos recorreram a fazer chá porque já não têm pão". Voltando-se para o interior da instituição que representa, o cónego deixou o seguinte aviso: "E se a Igreja abdicar dessa tarefa da defesa dos pobres por a considerar incómoda, menor ou alheia à sua missão evangelizadora, não está a cumprir com a sua missão".