16.6.09

Crise pode estar a fazer crescer recurso ao aborto

in Jornal de Notícias

Vários hospitais referem aumentos na ordem dos 20% nos primeiros meses do ano, a par da redução dos partos


O número de interrupções voluntárias da gravidez aumentou desde o início do ano, um crescimento que pode estar associado à crise e aos receios do seu impacto no aumento da família, segundo responsáveis clínicos.

Só no Hospital Amadora-Sintra, que serve 700 mil habitantes, dos quais uma significativa parte tem dificuldades socioeconómicas, os abortos aumentaram cerca de 23%, em paralelo com uma diminuição dos nascimentos.

Segundo o presidente do Conselho de Administração daquela unidade, Artur Vaz, ouvido pela agência Lusa, nos primeiros quatro meses deste ano foram realizadas 663 interrupções voluntárias da gravidez (IVG), através do Amadora-Sintra. Ou seja, mais 23% do que no mesmo período do ano anterior. Recorde-se que os abortos solicitados àquele hospital são encaminhadas para clínicas privadas, embora pagas pelo hospital, uma vez que os médicos são quase todos objectores de consciência. O administrador não hesita em atribuir este aumento à crise e aos "receios de assumir uma gravidez não planeada" perante "cenários de instabilidade económica".

A mesma interpretação é feita por Duarte Vilar, da Associação para o Planeamento da Família para quem "há mais IVG em altura de crise". As questões da maternidade e paternidade e a possibilidade de um novo filho, diz, "são questões muito delicadas para a maior parte dos casais". Em alturas de crise, "essa exigência é agravada com factores como o desemprego, baixa do rendimento familiar, instabilidade profissional e precariedade laboral". Duarte Vilar ressalva, contudo, que este aumento da IVG não significa que as pessoas estejam a substituir a contracepção pelo aborto, mas antes que está a existir um controlo mais forte da natalidade.

A corroborar este aumento está a Clínica dos Arcos, que realiza milhares de IVG encaminhadas pelos hospitais públicos. Entre Janeiro e Maio deste ano, foram feitos 2647 abortos, dos quais 1974 encaminhados por hospitais. Trata-se de um aumento de 24%.

Também na Maternidade Alfredo da Costa, a maior do país, as IVG têm aumentado, embora a um ritmo menos acelerado. Segundo o director, Jorge Branco, nos primeiros quatro meses deste ano, a maternidade efectuou 615 IVG, mais 35 do que no período homólogo de 2008. Ao nível dos partos, aquela instituição registou uma diminuição de 170 nascimentos, que Jorge Branco justifica com a existência de novos protocolos, que envolvem subsistemas de saúde e que levam as grávidas a optar por outras instituições.

Contactada pela Lusa, a Direcção-Geral de Saúde disse que fará um balanço nacional em finais de Julho, altura em que se completam dois anos sobre a entrada em vigor da lei que despenalizou o aborto até às dez semanas.