30.6.09

População portuguesa enfrenta pobreza e disparidade social

Lígia Silveira, in Agência Ecclesia

Estudo da ONGD TESE apresenta vínculos laborais precários, dificuldades em poupanças, endividamento e fraca confiança nas instituições governativas
A população portuguesa enfrenta "fortes níveis de pobreza e de grande disparidade social". Mais de metade da população, 57%, declara que o seu orçamento familiar é inferior a 900€. Estas são algumas das conclusões de um inquérito «Necessidades em Portugal», da responsabilidade da Organização Não Governamental para o Desenvolvimento (ONGD) TESE, apresentado esta Segunda-feira.

Numa amostra de 1237 inquéritos válidos, 1/3 da população manifesta dificuldades várias, e de diferente intensidade, face à vida quotidiana. Segundo o estudo, a que a Agência ECCLESIA teve acesso, 57% da população aufere até 900€ mensais, dos quais 29% tem um rendimento entre 505€ a 900€ e 28% vive com um rendimento líquido mensal inferior a 500€.

Cerca de 35% dos inquiridos tem dívidas e destes mais de 43% tem dívidas superiores a 25% do seu rendimento familiar. O estudo manifesta ainda que mais de 15% afirma terem tido dificuldades no pagamento de despesas relativas à habitação, nos últimos 12 meses. Cerca de 20% apresenta um índice de privação elevado.

O desemprego é mais elevado entre os indivíduos com níveis de instrução formal mais baixos. O estudo apresenta que 84,6% dos desempregados tem o ensino básico, 11,1% o secundário enquanto apenas 4,3% cumpriram um nível superior de ensino.

Cerca de metade dos inquiridos admite ainda não conseguir fazer qualquer poupança. De qualquer forma, os agregados que ganham até 500€, 76,5% dos casos afirma que nada ou quase nada lhes sobra por mês. Resposta equivalente para 36,8% dos agregados que auferem mais de 5000€ líquidos mensais.

O estudo mostra que 41,3% dos inquiridos experimenta vínculos de alguma precariedade e 10,5% estão desempregados. Neste quadro, 64% são mulheres. O tempo médio apresentado na condição de desempregado é longo, cerca de 3 anos.

O exercício de uma actividade remunerada, além da sua profissão principal, é opção para 8% dos inquiridos e, dentro destes o motivo invocado para o exercício de um trabalho remunerado adicional é a necessidade económica decorrente da insuficiência do rendimento obtido.

A precariedade assume-se como traço marcante no mercado de emprego. O contrato a termo certo (20,4%) é o regime maioritariamente experimentado pelos inquiridos. A manifestação de maior precariedade, o trabalho sem contrato, surge como a terceira categoria mais representada (12,3%).

Entre as iniciativas desejadas para melhorar a sua situação profissional, a emigração é equacionada por mais de 1/3 dos entrevistados.

O nível de confiança dos portugueses é também medido neste estudo. As instituições governativas merecem o menor nível de confiança dos inquiridos, concentrando um maior número de respostas nas categorias pouca ou nenhuma confiança (69,6%). Entre as instituições que conquistam maiores níveis de confiança por parte dos inquiridos, destacam-se as associadas ao sector privado e terceiro sector: ensino privado (76,4), sistemas de saúde privados (73,9%), e associações de solidariedade social (69,3%).

Os portugueses assumem uma elevada participação política activa (formal), através do exercício de voto nas últimas eleições para a Assembleia da República em 2005 (74,8%). Menos expressiva, com uma média total de 11,4%, é a participação informal na comunidade, expressa em actividades de voluntariado, no associativismo, ou através de donativos junto de uma instituição.

O estudo da TESE, em parceria com o Instituto da Segurança Social e a Fundação Calouste Gulbenkian, sob coordenação científica do CET-ISCTE, mostra que há um alargado conjunto de famílias portuguesas que, apesar de auferir recursos materiais que são suficientes para as excluírem do acesso às prestações sociais de combate à pobreza, não têm recursos suficientes para fazer face às suas despesas e cumprir expectativas e aspirações naturais de vida.

Essas famílias são adequadamente descritas como «famílias sanduíche» que estão fora da rede de apoios sociais de combate à pobreza, mas não deixam por isso de ser pobres.