4.8.09

Portugal resiste à crise mas não se prepara para a retoma, diz a agência Moody's

Cristina Ferreira, in Jornal Público

Superada a crise, Portugal pouco mais deve esperar do que o regresso ao crescimento lento da última década


À crise económica internacional, diz a agência de risco de crédito Moody's, Portugal até escapou "relativamente bem". O pior será a seguir, quando, com problemas de competitividade, muito endividado e sem estímulos para efectuar reformas, o país começar a sentir o efeito da inevitável subida dos juros e ficar sujeito a uma nova era de crescimento económico lento.

A análise da Moody's - uma agência de notação financeira que analisa o risco de concessão de crédito ao Estado português, tendo por isso influência nos custos do financiamento - destaca a forma como a economia nacional está a conseguir, durante o actual período de crise, apresentar um desempenho que fica acima de alguns dos seus parceiros europeus, mas assinala os enormes desafios de longo prazo que ainda terão de ser enfrentados e para os quais ainda não há solução à vista.

Começando por afirmar que "o país está a atravessar a crise financeira internacional relativamente bem", por não estar sujeito a uma bolha imobiliária e os bancos não estarem expostos a activos tóxicos, a agência diz ter duas "preocupações sérias de longo prazo". A primeira é a de saber se existe "vontade das autoridades para tomar as medidas necessárias para enfrentar a falta de competitividade do país" e a segunda é a dúvida em relação à "capacidade para reduzir o défice" de forma a que o rácio da dívida fique controlado quando chegar a retoma da economia.

É preciso um choque

Para a Moody's, o problema é que, ao contrário de outras ocasiões no passado, não se irá verificar um choque externo que obrigue as autoridades a actuar e a realizar reformas. O endividamento dos particulares, empresas e Estado é elevado, mas o seu ajustamento "deverá ser gradual e não abrupto, sendo por isso improvável que leve às acções necessárias para enfrentar os problemas estruturais de Portugal". E, num cenário deste tipo, com poucas mudanças e com um permanente aperto nas contas dos agentes económicos, a Moody's antecipa para Portugal "uma taxa de crescimento tendencial durante o próximo ciclo que não deverá ser superior aos valores situados entre 1,25 e 1,5 por cento que se registaram no último ciclo".

As previsões apresentadas pela agência para 2009 e 2010 já revelam algum deste pessimismo em relação à evolução da economia portuguesa depois da crise. Se, em relação a este ano, a contracção de 3,7 por cento no PIB é mais suave do que a queda de quatro por cento da média da zona euro, em 2010, Portugal voltará, segundo estas projecções, a apresentar um pior desempenho do que os seus parceiros. O PIB terá uma redução de 0,8 por cento, pior que os 0,1 por cento da zona euro. Especialmente negativa é a projecção para o investimento, que, depois de um quebra de 14,4 por cento este ano, ainda voltará a cair oito por cento no próximo ano. Ainda assim, a retoma, segundo as contas dos analistas da Moody's, pode chegar, de forma muito moderada, já nos últimos meses deste ano, com um trimestre que poderá já ser de crescimento positivo. O desempenho fraco durante este ano e o próximo terá ainda como consequência uma subida da taxa de desemprego para valores próximos de dez por cento em 2010 e uma variação negativa do valor dos salários em termos nominais este ano.

Em relação à classificação atribuída a Portugal - que se mantém inalterada em Aa2 -, a Moody's deixa para já um aviso: uma vez que Portugal é mais fraco que os seus parceiros em quase todos os factores considerados, "um novo enfraquecimento dos seus indicadores orçamentais colocará o rating sob pressão de descida".