18.9.09

Financiamento será central para o sucesso da cimeira climática de Copenhaga

Por Ricardo Garcia, in Jornal Público

Investimentos necessários para a adaptação ao aquecimento global serão superiores à ajuda oficial que os países mais pobres recebem hoje para o desenvolvimento


Dinheiro. Sem isto, provavelmente, a próxima cimeira climática das Nações Unidas, a realizar em Copenhaga em Dezembro, não vai chegar a lado nenhum. E não é pequeno o montante. Segundo as estimativas mais recentes, o volume de financiamento de que os países pobres precisam para enfrentar o problema do aquecimento global poderá ser superior à ajuda internacional ao desenvolvimento que actualmente recebem.

A negociação de um pacote financeiro será um dos pontos centrais da cimeira de Copenhaga, que pretende chegar a um novo acordo climático pós-Protocolo de Quioto. Terá tanto peso nas negociações como a discussão de novas metas para se reduzirem as emissões de gases que estão a aquecer o planeta.

"Sem financiamento, não haverá acordo em Copenhaga", antecipa Rosário Bento Pais, chefe-adjunta da Unidade para Alterações Climáticas da Direcção-Geral do Ambiente da Comissão Europeia.

Os números são superlativos. Para que o mundo se adapte a um aumento médio da temperatura entre 1,1 e 4,4 graus até ao final do século, serão precisos investimentos entre 33 e 116 mil milhões de euros por ano a partir de 2030, segundo uma avaliação da ONU. Para os países em desenvolvimento, em particular, os custos serão de 18 a 45 mil milhões.

Quem paga e como

Contabilizando também o custo do controlo das emissões de dióxido de carbono (CO2), a Comissão Europeia chegou a cifras ainda maiores: os países em desenvolvimento necessitarão de 100 mil milhões de euros anuais a partir de 2020. É mais do que o fluxo presente de ajuda oficial ao desenvolvimento -81 mil milhões em 2008.

Copenhaga vai discutir quem vai pagar essa factura e como. "A questão não é só saber quais serão as metas [de redução de emissões], é saber com que instrumentos financeiros e com que eficiência económica se vão atingir essas metas", diz Jorge Moreira da Silva, consultor para alterações climáticas do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.

As Nações Unidas já dispõem de um fundo de adaptação, alimentado com parte dos créditos gerados por projectos financiados pelo mundo industrializado para reduzir emissões em países em desenvolvimento.

Mas as estimativas das necessidades estão muito acima do que há disponível. "Estamos a falar de números completamente diferentes, de uma magnitude nunca antes falada", afirma Rosário Pais.

As duas primeiras vendas de créditos do Fundo de Adaptação, realizadas este ano, geraram 13 milhões de euros - apenas um por cento do investimento anual que se considera necessário no mundo.

Um estudo publicado em Agosto sustenta, ainda, que os cálculos até agora têm sido muito conservadores. Realizado por duas instituições britânicas - o Instituto Internacional para o Ambiente e o Desenvolvimento e o Imperial College de Londres -, argumenta que os cálculos da ONU deixaram de fora ou consideraram apenas parcialmente os efeitos das alterações climáticas sobre sectores como o turismo, os ecossistemas, a energia, a indústria e o comércio.

A análise conclui que os investimentos necessários serão duas a três vezes superiores aos previstos pela ONU. "Acredito que os custos possam subir ainda mais, à medida que os compreendermos melhor", afirma Martin Parry, investigador do Imperial College que liderou o estudo.

Ninguém contesta que os países desenvolvidos - os primeiros responsáveis pelo aquecimento global - devem pagar parte das necessidades de adaptação do mundo em desenvolvimento. Os montantes envolvidos podem assustar nas negociações, mas Martin Parry acha que não se devem esconder os números. "Eu diria que o realismo é melhor", afirmou ao PÚBLICO.