23.12.09

Tribunal Europeu ordena à Bósnia que deixe de discriminar os judeus e os ciganos

Por Jorge Heitor, in Jornal Público

A Constituição actual, que se baseia nos Acordos de Dayton, de 1995, terá agora de ser alterada, pois privilegia uns grupos em detrimento de outros


O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos condenou ontem a Bósnia-Herzegovina por proibir judeus e ciganos de se candidatarem a alguns postos-chave, incluindo o Parlamento e a Presidência da República. E ordenou-lhe que reformule a sua lei fundamental.

Dervo Sejdi e Jakob Finci, o primeiro cigano e o segundo judeu, ambos no exercício de importantes funções públicas, tinham-se queixado de que estavam a ser discriminados.

No seu preâmbulo, a Constituição da Bósnia-Herzegovina, resultante dos Acordos de Dayton (Ohio), de 1995, estabelece uma distinção entre duas categorias de cidadãos: "os povos constituintes da República" (bósnios muçulmanos, croatas e sérvios) e os "outros" (judeus, ciganos, outras minorias nacionais e os que não declaram pertencer a qualquer grupo étnico específico). À segunda categoria pertence sete por cento de uma população de 3,9 milhões de habitantes, residente num território de 51.197 quilómetros quadrados.

A Câmara dos Povos da Assembleia Parlamentar (câmara alta) e a Presidência da República são compostas unicamente por pessoas que pertencem aos três povos constituintes.

Jakob Finci recebeu da comissão eleitoral a confirmação por escrito de que não se poderia candidatar à chefia do Estado nem à Câmara dos Povos, por ser de origem judaica.

Por isso, ele e Sedji recorreram em 2006 ao Tribunal Europeu, invocando os artigos da Convenção Europeia dos Direitos Humanos que proíbem tratamentos desumanos ou degradantes.

Um grande passo

Este tribunal foi criado em Estrasburgo pelos países do Conselho da Europa, para tomar conta das queixas de violação da Convenção Europeia de 1950.

No seu parecer, aprovado por 14 votos a favor e 13 contra, os juízes disseram que a atitude das autoridades bósnias "não tem uma justificação objectiva e razoável", sendo contrária à Convenção.

"Trata-se de um grande passo na luta da Europa contra a discriminação e o conflito étnico", comentou Sheri P. Rosenberg, advogada norte-americana que aconselhou Finci neste processo. "O Tribunal Europeu tornou claro que a exclusão baseada na raça não tem lugar na Europa", disse por seu turno Clive Baldwin, conselheiro jurídico da Human Rights Watch.