26.5.10

"Estou novo para desempregado e velho para trabalhar"

por Jorge Cláudio, Amadeu Araújo, in Diário de Notícias

Foi um dos últimos despedidos da Delphi. Ainda tinha esperança de ficar? Não. De maneira nenhuma. Já vinha a falar-se há vários anos. Desde 2007 que andamos com o credo na boca. A certeza era tanta que ficaram logo decididas as indemnizações. Em finais do ano passado, na secção onde eu trabalhava, na cintagem, soubemos que ia encerrar e deduzimos logo à partida que iríamos ser despedidos. Foi só esperarmos pelo pior.

Quando soube?

Em finais do ano passado. Só não sabia a data exacta em que sairia. Falava-se em Abril, Maio e eu saí

na segunda remessa.

Como é que vê este último dia?

Com tristeza, porque são mais umas dezenas a engrossar o desemprego. É a região que perde, as pessoas que vão ter muita dificuldade em encontrar emprego e quando assim é fica-se angustiado com a incerteza que aí vem. É quase um desespero, mas temos de saber reagir e seguir em frente.

Vai procurar emprego?

Com esta idade, estou novo para desempregado e velho para trabalhar. Os empregadores olham para uma pessoa de 45 anos e é complicado darem-nos trabalho, sobretudo efectivo e com contrato.

Teme o desemprego?

O problema é que é muito complicado encontrar ocupação, e então no interior, mas sobretudo em Trancoso, onde vivo. Há escassez de postos de trabalho e dificilmente encontrarei um emprego efectivo. Terei de ver primeiro se consigo uma formação, porque de experiência só tenho os 20 anos que trabalhei na empresa.

Como vai ser a sua vida daqui em diante? Vai pedir o subsídio de desemprego ou montar um negócio?

Não está tempo para aventuras. Vou se calhar roubar algum a quem tem roubado algum. Ainda não sei o que irei fazer. Felizmente não pago renda de casa nem tenho empréstimos. Tenho contas pequenas e a minha mulher trabalha por conta própria na agricultura. Mas os rendimentos não são certos.

O Governo ou a câmara podiam ter feito algo para evitar os despedimentos?

Não. Isto é lavar as mãos como Pilatos. Eles falam, dão-nos apoio e dizem que vão criar soluções, mas não têm capacidade para fazer nada e, da forma como anda o País, muito menos ainda. Não digo que o façam por mal, mas o que é um facto é que nada podem fazer.

Que empresa deixa para trás?

Não acredito muito no futuro desta fábrica. A crise está a fazer diminuir a produção e quem não foi despedido também não fica em bons lençóis. Oxalá me engane. Já houve aqui mais de três mil empregados e hoje ficam apenas 300. Isto não é bom sinal.