26.7.10

O “Estado social”

João Marques de Almeida, in Económico

Portugal vive uma situação surrealista. Está toda a gente convencida que haverá eleições antes de 2013, mas ninguém sabe quando. Resultado: os partidos políticos estão em campanha eleitoral permanente.

Se a economia do país crescesse 5% por ano, se o desemprego fosse de 3 ou 4%, se a pobreza diminuísse, se não houvesse o défice e a dívida públicas que existem, até seria divertido. Na situação em que estamos, é dramático. Pior, o "Estado social" tornou-se agora uma questão de campanha eleitoral. O tema mais importante da política europeia para os próximos anos, que exige um grande esforço e determinação para ser objecto de consensos alargados, foi colocado no centro da luta política. A racionalidade (o bem mais precioso e raro da política) foi substituída pela demagogia, pelo populismo e por chavões ideológicos.

Se não arrepiarmos caminho, pode ter começado o caminho do país para fora do Euro. Será que as nossas elites políticas não percebem o que se passa na Europa? Acham que a "crise" já acabou, e que estamos a regressar ao "normal"? E se entendem, resolveram seguir em frente, negando a realidade, a caminho do suicídio político? O modo como foi afastada uma das propostas mais corajosas e lúcidas feitas por um actual ministro, a imposição de limites constitucionais ao défice (e que infelizmente o PSD não adoptou nas suas propostas), leva-me a desconfiar do pior.

O que se passa é muito simples. Nos próximos três anos vai definir-se a natureza da "zona Euro pós-crise". Como será? E quem lá estará? E em grande medida as clarificações serão feitas pela capacidade de reformar o "Estado social". Estamos a assistir a um processo de redefinição do Estado europeu (que por sua vez irá redefinir a União Europeia). O Estado europeu e a União serão muito diferentes em 2014 do que são hoje. Quem não entende isto, não percebe o que se passa na Europa. E quem vai definir os padrões do novo "Estado social europeu" serão os mais avançados nas reformas, os países do norte europeu. Se os países do sul não acompanharem, não poderão continuar a ter a mesma moeda.

Mas há ainda duas questões a considerar. Por vezes quando ouço falar das "conquistas" do "Estado social" em Portugal, parece que se está num debate sobre Teoria Política, mas não sobre a situação social no nosso país. O "Estado social" é fantástico, o pior é a educação desigual, a segurança social e o sistema de saúde insustentáveis, o crescente desemprego e o aumento da pobreza. Ou seja, há um "Estado social", mas não há justiça social (daí as aspas durante todo o artigo). Dito de outro modo, o "Estado social" está a falhar onde não pode falhar.

O segundo ponto é uma reflexão para aqueles que querem defender o actual "Estado social" a todo o custo. Com a actual evolução demográfica e com um crescimento económico quase nulo, como vão defendê-lo sem dinheiro para aumentar as despesas sociais? A defesa do "Estado social" só é credível quando se pode aumentar as despesas. Quando não se pode, é o caminho para a mentira e o desastre.