31.8.10

Famílias ciganas sem nova casa à vista

por Luís Maneta, Évora, in Diário de Notícias

Cerca de 200 pessoas, das quais 80 são crianças, vivem sem água canalizada nem esgotos no castelo.

Enquanto lava a roupa num tanque de pedra, Fausta Catalão diz ter "esperança" em mudar de "casa" depois de a autarquia de Campo Maior ter prometido encontrar uma "solução habitacional" para a comunidade cigana instalada há décadas num intrincado bairro de barracas erguido no interior do castelo da vila.

Bem lá no alto, numa zona conhecida como Mártir Santo, todos esperam pela chegada do dia em que serão derrubadas as casas construídas há décadas com paredes de chapa e tectos de plástico. "Tenho os filhos já todos casados e quando vim para aqui ainda eram pequenos. Estão a acabar com as barracas por todo o lado e esqueceram-se de nós. Não se admite uma coisa destas."

A esperança numa nova casa vai, no entanto, ter de aguardar mais alguns meses, pelo menos até ser aprovada uma candidatura da autarquia ao Regime de Apoio à Recuperação Habitacional em Áreas Urbanas Antigas (Rehabita) e desanexados os terrenos onde surgirá o novo bairro, actualmente inseridos em área de reserva agrícola.

Uma fonte da Câmara Municipal de Campo Maior avançou ao DN que o realojamento previsto para o início do próximo Outono "terá de ser adiado", uma vez que a instalação da comunidade cigana em contentores, como se previa inicialmente, "não foi aceite por ninguém". "Como não temos recursos financeiros para outra solução, resta esperar que a candidatura seja aprovada pelo Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana", diz Alexandre Florentino, assessor do presidente da autarquia. "Só depois será possível avançar com uma nova data."

No Mártir Santo, os dias são de espera. Com o marido preso em Pinheiro da Cruz - "foi apanhado a conduzir sem carta e mandaram-no para a cadeia porque já não era a primeira vez" - uma mulher lamenta as dificuldades de quem se vê obrigado a morar em condições precárias: "Não temos outro remédio. É aguentar."

No bairro vivem cerca de 200 pessoas, incluindo 80 crianças com menos de 12 anos, que habitam em barracas partilhadas por pais, avós e tios. Não há esgotos nem água canalizada - "temos de ir aí a uma fonte para encher os baldes" - e as instalações eléctricas são precárias. "Sem água, como é que as crianças podem ir limpas para a escola?"

"Só nos mudam quando para aí morrer uma casa de família", diz Maria Helena, momentos antes de mostrar como uma boa parte do chão da barraca onde vive foi "cair lá em baixo", no fundo de um fosso, na sequência de um deslizamento de terras. "Agora temos de dormir aqui na cozinha". Na cozinha que também é sala. E que constitui o único espaço relativamente seguro, embora em dias de vento "abane por todos os lados".

Um dos "patriarcas" da comunidade recorda que a "promessa de casa" já é "velha". E que os problemas se agravam todos os invernos, quando a chuva se infiltra nas paredes da velha muralha, originando derrocadas. "Isto quanto mais chove, mais cai. Rolou para aí uma pedra enorme que derrubou a chapa e entrou por uma barraca." A pedra parou ao lado de uma cama onde dormiam dois rapazes. "É um milagre terem ficado vivos."