26.11.10

Trabalho temporário tende a reduzir emprego e produtividade do país

Por João Ramos de Almeida, in Jornal Público

As reformas laborais que criaram uma dualidade entre os contratos fixos e os temporários poderão, a prazo, "reduzir o emprego total" e ter um efeito "significativo no abrandamento da produtividade", conclui o relatório anual da Comissão Europeia sobre o mercado laboral europeu em 2010, ontem divulgado.
Se, no início, o trabalho temporário teve efeitos positivos no emprego através de uma maior adaptabilidade das empresas, as teorias mais recentes mostram que esses ganhos no emprego "estão a ser gradualmente erodidos", refere o documento.

A análise é feita num dos três capítulos, dedicado aos jovens e à segmentação dos mercados laborais na União Europeia (UE). E integra-se num relatório que sugere medidas que promovam o emprego na conjuntura actual de retoma lenta da actividade, no quadro das metas da Estratégia Europa 2020. É nesse contexto que surgem as críticas aos efeitos estruturais de um mercado laboral segmentado, em expansão na UE.

Portugal em terceiro lugar

O relatório mostra que Portugal está entre os três países da UE com maior percentagem de trabalho temporário (com a Polónia e Espanha). O problema não é o peso dos empregos temporários no emprego juvenil (de 15 a 25 anos). Os valores de Portugal (53,5 por cento em 2009) estão acima da média europeia (40,2 por cento). O mesmo se passa com a Alemanha (57,2 por cento) ou com a Suécia (53,4 por cento).

Trata-se de uma forma de entrar no mercado. A crítica surge quando tende a perpetuar-se. Em Portugal, é temporário um em cada cinco trabalhadores de idade entre os 15 e 49, contra um em cada dez na UE, tal como acontece com a Alemanha e a Suécia. Na Polónia e Espanha é um em cada quatro. Nos trabalhadores entre 50 e 64 anos, a média europeia - Alemanha e Suécia inclusive - é a de que um em cada 20 empregos é temporário. Mas em Espanha e Portugal é cerca de dois em cada 20.

Este foi o resultado de reformas impulsionadas desde os anos 80, para combater o desemprego estrutural, através da desregulação dos contratos e da expansão de agências de trabalho temporário. O trabalho temporário permite às empresas adequar o nível de emprego às encomendas e ajustar o número de empregados às capacidades manifestadas. Mas acaba por ter efeitos profundos. Primeiro, na subida do desemprego. Os empregos temporários foram os mais afectados na recessão de 2009. O emprego tornou-se mais volátil. Segundo a OCDE é 2,5 vezes maior do que nos contratos permanentes. Os casos extremos analisados pelo relatório são o espanhol (seguido por Portugal) e o alemão. Depois, os trabalhadores temporários tendem a ter acesso mais reduzido a formação. Pior: o relatório lembra que a fraca expectativa de vida leva esses trabalhadores a não se esforçar. Esse efeito combinado pode "representar um abrandamento significativo na taxa de crescimento do factor produtividade".

Finalmente, "a segmentação no mercado laboral aumenta o risco de muitos jovens ficarem apanhados (até aos 30 anos), entre empregos temporários e intervalos de desemprego". Adia-se o início de vida adulta e de criação de uma família, transformando-se em "insegurança, com impacto no seu comportamento individual".

A saída passa por "uma estratégia global, baseada na flexisegurança" - flexibilidade no trabalho com fortes níveis de protecção no desemprego - "de modo a combater a segmentação do mercado". Medidas propostas: um tipo de contrato que acabe com a assimetria entre contrato permanente e a prazo, "a introdução de um salário mínimo, elegibilidade universal na protecção do desemprego sem excepções consoante o tipo de contrato e limite ao uso de contratos temporários a certas circunstâncias, como as verdadeiras situações de tarefas temporárias ou trabalhos bem pagos".