31.8.11

Voluntários também vão cuidar de bebés nas creches

Por Ana Cristina Pereira, in Jornal Público

Era uma reivindicação antiga das instituições de solidariedade. Lá para Outubro, o país deverá ver aumentado o número de vagas nas creches. A portaria que permite ter mais crianças em cada sala já seguiu para publicação. Voluntários serão chamados para reforçar os cuidados.

"Dependendo da vontade das instituições, temos um número potencial de 20 mil lugares em creches", declarou ontem o ministro da Solidariedade e Segurança Social, Pedro Mota Soares, citado pela agência Lusa. Os berçários passarão de um máximo de oito para dez, as salas de crianças de um aos dois anos de dez para 14 e as salas dos dois aos três anos de 15 para 18.

O ministro democrata-cristão já avançara com estes números durante a apresentação do Plano de Emergência Social. Na altura, referiu alterações na estrutura familiar e sócio-demográfica e focou as creches como estruturas "determinantes" para conciliar a vida familiar com a vida profissional.

"É preciso ver como é que isso se faz", avisa Lúcia Santos, presidente da Associação dos Profissionais de Educação de Infância. "Duas crianças por sala pode parecer pouco, mas pode ter efeitos na qualidade do serviço. A educação das crianças pequenas faz-se na interacção com os adultos. Havendo mais crianças, há menos tempo para a interacção com cada uma."

Ontem, no Centro Social da Paz, da Cáritas de Setúbal, o ministro reiterou que o aumento de vagas será feito "mantendo sempre a qualidade e a segurança". Está convencido de que é possível alargar a resposta com a capacidade instalada. O eventual reforço técnico ficará nas mãos das instituições.

"Garantir-se a mesma qualidade é uma questão de honra para nós", reagiu o presidente da Confederação de Instituições Particulares de Solidariedade Social, Lino Maia. "Defendemos que a inclusão social passa pela educação e a educação começa à nascença." O sacerdote assegura que serão contratados mais educadores de infância e auxiliares de acção educativa e adianta que as creches se abrirão ao trabalho voluntário. "Até agora, todo o pessoal tinha de ser contratado. A partir de agora, pode haver voluntários", esclarece.

Formação para voluntários

Os voluntários serão sujeitos a formação. Mesmo assim, Lúcia Santos coloca muitos "ses": "Se os voluntários aparecerem, se forem pessoas com ética, com respeito pelas crianças e pelas famílias... Há quem pense que para estar com crianças pequenas qualquer um serve. Não serve. As crianças estão a aprender tudo - a maneira de estar, de falar, de tratar os outros".

O presidente da União das Misericórdias, Manuel Lemos, também veio ontem a público prometer qualidade. Quis deixar claro que os números avançados "vêm de uma avaliação feita por técnicos": "Só acolheremos mais crianças nos sítios onde tenhamos espaço e capacidade técnica".

Dadas as exigências em vigor, muitos equipamentos não poderão acolher mais meninos. Desde logo, explica Lúcia Santos, tem de haver dois metros quadrados por criança. Com bebés, o espaço é a duplicar, já que se impõe uma zona para dormir e outra para brincar. "Temos uma panóplia de situações muito grande", salienta Lino Maia. As instalações construídas nos últimos anos estão feitas à medida, mas há instalações antigas que vão além - estão sobredimensionadas. E serão essas que terão capacidade para acolher mais miúdos.

Não parece haver unanimidade. "Esta medida poderá ter efeitos muito graves para as crianças, uma vez que vai transformar as creches em armazéns", comentou em declarações à Lusa Fernanda Mateus, do PCP. "As actuais regras têm como base a garantia de qualidade de atendimento e acolhimento a crianças dos três aos 36 meses, num período em que necessitam de cuidados personalizados, tendo em vista não apenas a sua guarda, no período em que os pais trabalham, mas que contribuam para o seu desenvolvimento harmonioso."

"Não estamos mal", avalia Lúcia Santos. Com o programa Pares, o país alcançou uma cobertura de 36 por cento na rede, o que o coloca um pouco acima da meta da Comissão Europeia. Há dois adultos por sala, o que dá um rácio de 5,5 crianças por profissional, igual ao de países como a Finlândia. Agora, subirá para uma média de 7, o que é igual à Bélgica. "Vai ser duro", prevê. Carlos Andrade, vice-presidente da União das Misericórdias, até acha que "o Governo foi conservador": "A maior parte já tem mais crianças do que diz a lei. É uma lei sueca, desadequada da realidade do nosso país; por isso há famílias a dizer que custa tanto ter um filho na creche como na universidade".