21.12.11

Sete casos de profissionais qualificados candidatos à emigração

Por João Ramos de Almeida, Graça Barbosa Ribeiro, in Público on-line

O primeiro-ministro sugeriu a emigração como alternativa ao desemprego. Como encaram a opção de sair do país médicos, dentistas, enfermeiros, farmacêuticos, professores, engenheiros e arquitectos? Olhamos para os sete casos.

Médicos: desemprego já é realidade

O bastonário da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva, declara que as perspectivas são "muito más". No SNS as contratações estão suspensas desde Setembro e no sector privado há um excesso da capacidade instalada. O bastonário afirma que o desemprego médico "já é uma realidade" e antecipa uma situação "cada vez mais dramática", devido ao que diz ser um "desinvestimento na saúde". "Estamos a formar os técnicos mais caros para depois os exportar, o que não faz sentido", critica.

José Manuel Silva caracteriza as opções políticas como "despesismo puro" e considera as afirmações de Passos Coelho "profundamente infelizes". Deixa ainda uma nota de "espanto e indignação", criticando a diminuição do SNS e o aumento das listas de espera e, por outro lado, a exportação de profissionais altamente qualificados. "É um absurdo", diz.

Dentistas: solução é a Europa

O bastonário dos médicos dentistas, Orlando Monteiro da Silva, nota que a tendência de emigração tem alguns anos, pois o mercado não consegue absorver todos os licenciados. Os dentistas emigram sobretudo para a Europa, mas o Reino Unido, Suécia, Suíça, Noruega ou Espanha são os destinos mais escolhidos. O bastonário estima que só no Reino Unido estejam já cerca de 600 dentistas, sendo este o país mais apetecido. Uma das vantagens da Europa é o reconhecimento profissional imediato. "Os portugueses são procurados pela excelente qualificação profissional, facilidade com as línguas, e facilidade de adaptação", afirma. O "grande desafio", admite, é referenciar os profissionais qualificados e tentar que depois regressem. Em relação às declarações de Passos diz que a emigração não é "uma fatalidade", mas preferia que em Portugal houvesse mais oportunidades.

Enfermeiros: exportação "a custo zero"

Germano Couto foi recentemente eleito bastonário da Ordem dos Enfermeiros e tomará posse em Janeiro. Admite que as perspectivas "não são animadoras" e considera "ridículo" que Portugal exporte enfermeiros "a custo zero". Os destinos mais escolhidos são o Reino Unido, Irlanda, Suíça e Espanha, países onde o reconhecimento académico é imediato. Quanto às declarações de Passos Coelho, considera-as de uma "falta de visão política e estratégica lamentável". "Preocupa-me que o primeiro-ministro Pedro Passos Coelho veja a emigração como solução, porque Portugal deve investir no seu território antes de pensar na emigração", afirma.

A bastonária ainda em funções, Maria Augusta Sousa, alerta para o conjunto cada vez maior de enfermeiros que procura trabalho no estrangeiro. "O Estado português fica mais pobre", declara.

Farmacêuticos: excesso de cursos superiores

O bastonário dos Farmacêuticos, Carlos Maurício Barbosa, desvaloriza as afirmações do primeiro-ministro Pedro Passo Coelho e diz que "têm algum sentido, porque em Portugal não há muitas oportunidades". O bastonário Carlos Maurício Barbosa critica o excesso de cursos superiores e diz que há demasiados farmacêuticos (cerca de 900 saem anualmente com formação superior). O bastonário prevê que os próximos anos, à semelhança de 2011, sejam "muito problemáticos". Há já um conjunto de farmacêuticos a emigrarem, sendo que o Reino Unido é o destino mais escolhido. "É um grande empregador de farmacêuticos portugueses", diz. O bastonário sublinha que os farmacêuticos portugueses estão "muito bem preparados", dominam com facilidade o inglês e "são muito pretendidos" no Reino Unido. "Penso que este fluxo [de emigração] irá aumentar", afirma.

Professores: 12.500 desempregados

O que mais indigna os representantes dos professores na sugestão de emigração feita pelo primeiro-ministro é aqueles acreditarem que em Portugal "não há docentes a mais". "O desemprego, que atinge já cerca 12.500 pessoas e aumentará brutalmente para o ano, não resulta de excesso de profissionais, mas de medidas que prejudicam a qualidade da Educação e visam expressamente afastar professores da escola", considera Mário Nogueira, dirigente da Fenprof. Pela mesma razão, Lucinda Dâmaso, da Federação Nacional de Educação, acredita que "a questão da emigração não se coloca". Ambos defendem que, se um dia vier a ser equacionada, terá de ser organizada pelo Estado, mediante protocolos de cooperação. "Os cálculos que têm de ser feitos para projectar o pilar de uma ponte são iguais aqui, no Brasil ou em Angola, mas nós trabalhamos com pessoas", diz Nogueira.Engenheiros: "Está a sair gente que faz falta"

O bastonário da ordem dos Engenheiros, Carlos Matias Ramos, estava habituado referir-se à deslocação de profissionais para o estrangeiro como "experiências de internacionalização", mas admite que, embora lhe "custe", tem de passar a utilizar o termo "emigração". Refere-se, principalmente, aos engenheiros civis que, devido à estagnação do investimento em obras públicas, têm escolhido como destinos o Brasil, Angola e Moçambique. "Um fenómeno dramático", avalia, "e não só do ponto de vista individual, de quem se vê forçado a abandonar Portugal por falta de alternativas".

Diz o bastonário que "é importante que o Governo compreenda as consequências, em termos nacionais, da saída dos engenheiros mais qualificados". "No momento de crescimento da economia esta gente vai fazer uma falta imensa ao país", avisa.

Arquitectos: Brasil e Angola são opções

Ainda não há dados definitivos, mas Marco Roque Antunes, da direcção da Ordem dos Arquitectos, não tem dúvidas de que este ano o número de certificados para a prática profissional da arquitectura no estrangeiro vai crescer até às três centenas. Com uma particularidade: se durante muitos anos Espanha foi o destino de eleição, desde 2008 a par com o Reino Unido, agora a maior parte dos arquitectos opta pelo Brasil e por Angola.

"Temos a sensação de que não são saídas pontuais, mas opções de vida", lamenta. Sem esperar pela sugestão do primeiro-ministro Pedro Passos Coelho sobre a emigração, que MarcoRoque Antunes se escusou a comentar, a ordem já tratou de integrar o Conselho Internacional dos Arquitectos de Língua Portuguesa, para facilitar a adaptação dos profissionais aos países de destino.