28.3.12

Portugal: o retrato lá fora de um povo falido

in Sol

Nuno Pinto, 40 anos, está desempregado e pensa dar o único passo que lhe parece ser a solução para os seus problemas financeiros: declarar falência. Nuno, como muitos portugueses, tem a ‘corda ao pescoço’. Não tem rendimentos, vive da ajuda dos pais idosos e continuam a cair as contas dos créditos que contraiu antes de Portugal mergulhar em crise financeira. A Associated Press traça o retrato de um povo que conta cada vez mais casos de famílias a declararem falência.

Se antes poucos portugueses sabiam da possibilidade de as famílias declararem falência, hoje Portugal já regista um número de insolvências pessoais superior ao das empresas. No ano passado e pela primeira vez na história portuguesa, 55% das falências foram de pessoas singulares, escreve a AP numa reportagem que tem sido reproduzida na imprensa internacional.

«Tenho dívidas até ao pescoço», disse Nuno Pinto na sua visita à DECO para aconselhamento jurídico. Casado e com uma filha de nove anos, vai voltar a não pagar a prestação da casa, ficando à beira de uma acção de despejo iminente.

«Estou aqui para ver se consigo aquilo que é a minha última hipótese: abrir falência», disse Nuno à AP. Conseguir o processo de insolvência nos tribunais vai permitir-lhe negociar um plano de pagamento especial aos seus credores, resolvendo para já as suas preocupações mais urgentes.

A Associated Press refere que «as histórias como a deste homem não são difíceis de encontrar actualmente em Portugal, país com 10,6 milhões de pessoas que enfrentam as piores dificuldades da sua história recente».

Os portugueses estão a pagar um preço elevado pelo «falhanço» do país na última década, com uma economia que não registou praticamente nenhum crescimento na viragem do século.

Nuno Pinto é um dos mais de 670 mil portugueses que no ano passado falharam as suas obrigações. O problema não é só o desemprego, explica a reportagem da AP. «As medidas de austeridade incluíram muitos cortes no sector público. O Governo cortou apoios sociais e aumentou impostos, destacando-se o aumento do IVA da electricidade de 6 para 23%».

Depois das contas e impostos, pouco sobra no orçamento familiar das famílias de classe média para despesas básicas como alimentação e roupa.

Natália Nunes, uma das advogadas da DECO, disse à AP que a classe média é a que está a sofrer mais. A família típica que nos pede ajuda é constituída por casais entre os 35-45 anos com um filho e pouco mais de 1500 euros por mês. «Lembro-me de uma família com uma criança que esteve cá há pouco tempo e que disse que começa o mês com quatro ou cinco euros. Ouvimos esse tipo de histórias todos os dias».

David Justino, um serralheiro de 32 anos que trabalha a abrir portas em acções de despejo, contou à AP que chega a vestir coletes à prova de bala com medo das reacções. Mas refere que as famílias normalmente ficam-se pelas ameaças. O seu trabalho é duro: «Se fosse apenas despejar adultos não seria um problema. O que me incomoda é quando há crianças pequenas ou pessoas portadoras de deficiência».

AP/SOL