29.10.12

Austeridade ameaça combate à pobreza europeia

Liliana Coelho, in Expresso

As políticas de austeridade, nomeadamente os cortes das prestações sociais, vão levar ao aumento da pobreza e da exclusão social, ameaçando as metas da Estratégia Europa 2020.

As medidas que o Governo tem anunciado vão contra os objetivos da Estratégia Europa 2020, assinada pelos Estados Europeus em 2010, que visa reduzir em 20 milhões o número de pessoas em risco ou em situação de pobreza e de exclusão social - no caso português são menos 200 mil.

Em causa está a política de austeridade seguida pelo Governo, nomeadamente, os cortes das prestações sociais, com medidas como a redução do subsídio de desemprego, o rendimento social de inserção ou o complemento solidário para idosos, que vão levar ao aumento da pobreza e da exclusão social.

Os factos são fáceis de constatar e o problema está a agravar-se há três anos, como aponta o investigador Carlos Farinha Rodrigues que se tem dedicado a estudar as desigualdades sociais em Portugal.

"O acordo com a troika não foi o único que o Governo assumiu a nível europeu, mas esquecem-se disso. Desde 2010 que a Estratégia 2020 foi posta na gaveta, sendo que a única política que temos em marcha é a da austeridade", disse ao Expresso Carlos Farinha Rodrigues

As metas definidas na Estratégia Europa 2020 já eram pouco ambiciosas em relação ao que tinha sido alcançado na última década, sendo que agora estão completamente ameaçadas, segundo o professor do ISEG que esta semana apresentou, em livro, o resultado uma investigação entre 1993 até 2009, intitulado "Desigualdade Económica em Portugal".

Enfraquecimento das políticas sociais

Portugal está a assistir a um enfraquecimento das políticas sociais, numa altura em que estas são mais necessárias, prejudicando as pessoas com mais dificuldades.

O Programa Nacional de Reformas (PNR) 2020, que foi aprovado em Conselho de Ministros, a 20 de março do ano passado, na sequência da Estratégia Europa 2020, previa uma série de medidas com vista ao cumprimento das metas do acordo europeu, mas sempre em linha com a conjuntura económica.

"O PNR foi elaborado em articulação com o Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC), garantindo a coerência entre os dois instrumentos, com reformas que no curto prazo levem em conta a prioridade da consolidação orçamental e da correção dos desequilíbrios macroeconómicos", podia ler-se no documento.

O principal objetivo do PNR é promover a inclusão e a redução da pobreza e das desigualdades sociais, através de ações de qualificação e promoção da empregabilidade.

Relativamente aos mais desfavorecidos, o Plano Nacional de Reformas prevê medidas como a requalificação de 20 mil desempregados, a promoção do emprego e da formação a 115 mil beneficiários do IRC e a atribuição do Complemento Solidário para Idosos.

Entretanto, o ministério de Pedro Mota Soares anunciou o corte das prestações sociais, nomeadamente a redução em 6% do limite mínimo do subsídio de desemprego, a diminuição do Rendimento Social de Inserção para 178 euros ou o corte de 2,25% do limite para a atribuição do Complemento Solidário para idosos (350,64 euros), que prejudicam as pessoas mais desfavorecidas e comprometem as metas do PNR.

Aumento da pobreza e da exclusão social

Segundo o estudo coordenado por Carlos Farinha Rodrigues para a Fundação Francisco Manuel dos Santos, a desigualdade familiar diminuiu até 2009, mas Portugal continuou a ser um dos países mais desiguais a nível europeu.

"Há uma redução na desigualdade dos rendimentos das famílias, mas mantêm-se, no entanto, os altos níveis de desigualdade salarial", sublinhou o professor.

Entre 1993 e 2009, a pobreza em Portugal diminuiu de 23% para 18%, encontrando-se apenas a dois pontos percentuais acima da média europeia.

O estudo termina em 2009, altura em que começou a crise económica e financeira, sendo de antecipar uma inversão na tendência de decréscimo das desigualdades.

"Estou convencido de que 2009 representa o fim de um ciclo de diminuição das desigualdades e da pobreza, uma vez que a partir de 2010 a medidas de combate à crise põem em causa os fatores que são apontados como diminuidores destes dois problemas sociais", disse Carlos Farinha Rodrigues.

Os números provisórios do Instituto Nacional de Estatística (INE) referentes a 2010 já apontam para uma inversão desta tendência, assim como os dados do Banco Alimentar e de outras instituições de solidariedade social.

O aumento da pobreza e das desigualdades vão assim contra os objetivos do PNR 2020. O Expresso contactou o Ministério da Solidariedade e da Segurança Social para obter um balanço do Plano Nacional de Reformas, mas ainda não obteve qualquer resposta.