13.11.13

Portugal é dos países europeus onde mais se demora a pagar dívidas

Camilo Soldado, in Público on-line

Consumidores, empresas e entidades públicas estão entre os que mais se atrasam a pagar dívidas. Pior pagador que o Estado português só Grécia, Itália e Espanha.

Segundo o estudo anual Intrum Justitia, que questionou 10.000 empresas de 29 países europeus (800 das quais em Portugal), o Estado português demora, em média, 133 dias a regularizar as dívidas, mais 73 dias do que o previsto, e mais 72 do que a média europeia.

Portugal é dos países com maior prazo de pagamento acordado, mas também onde as partes se atrasam mais a regularizar as dívidas. Em relação ao estudo de 2012, as empresas e o Estado diminuíram, no entanto, o número de dias que demoram a pagar. O mesmo não aconteceu com os particulares, que mantêm o registo.

A média europeia de perdas por incobráveis (facturas que não são liquidadas, considerado dinheiro perdido) é de 3% do volume total de vendas, o que significa que as empresas perderam 350 mil milhões de euros em 2013. Em Portugal, a percentagem sobe para 3,9%, o que se traduz numa perda de 5900 milhões de euros. Deste número, 2600 milhões de euros são devidos pelo Estado a empresas.

O director geral da Intrum Justitia, Luís Salvaterra afirma que, em Portugal, “quase ninguém paga a tempo”, o que considera “aflitivo”. E com este atraso “as empresas perdem competitividade”, acredita. Isto numa altura de escassez na concessão de crédito à economia.

Luís Salvaterra explica que, hoje em dia, as empresas se financiam “com os fornecedores e não com os bancos” pois, mesmo as empresas que o podem fazer, “não vão pagar a tempo” se recebem com atraso, porque afecta o seu fluxo de caixa.

O presidente da CIP, António Saraiva, alerta que os atrasos de pagamento resultam na “concorrência desleal” entre empresas e tem consequências directas na de postos de trabalho.

Apesar de haver uma lista de credores do Estado português publicada desde 2008 e do valor elevado que este deve às empresas, apenas uma empresa privada denunciou a dívida desde então. Luís Salvaterra justifica esta situação com o “receio de perder aquela que será, eventualmente, uma posição preferencial”, por exemplo, “em concursos públicos”. “É dinheiro garantido – podem receber mais tarde, mas recebem”, esclarece.

A nível europeu, o estudo mostra que 25% das falências são causadas por problemas de liquidez que resultam de atrasos e não pagamentos. A partir dos seis meses após a venda, menos de metade do valor em falta é restituído.

Apenas a Suíça e Finlândia registam uma taxa abaixo de 1,9% de dívidas incobráveis.

Serviços são o sector mais atingido
Apesar da recuperação do indicador de clima económico nos últimos meses, as empresas continuam a ser afectadas pelo baixo consumo. Em Portugal, os serviços empresariais como agências de comunicação, publicidade e marketing são os mais afectados pelo não pagamento de dívidas. Em 2013, este sector verificou uma taxa de dívidas incobráveis na ordem dos 6%.

A construção é o segundo sector mais afectado, ao perder 5,2% do volume total de vendas, enquanto na saúde o valor é de 4,4%. Para Portugal, não há dados sobre o sector dos media, que, a nível europeu, verificou o maior agravamento na percentagem de incobráveis.

Luís Salvaterra não prevê que “vá haver melhorias rápidas”, quer ao nível dos privados, quer ao nível das empresas.

A experiência com o Processo de Revitalização Especial (PER) – programa lançado em 2012 que pretende auxiliar devedores que se encontrem em situação económica difícil susceptíveis de recuperação – não tem sido, segundo Salvaterra, “muito positiva”.

Apesar de o decreto-lei 62/2013 ter entrado em vigor em Maio, também a legislação não teve grande impacto. A lei que segue directivas europeias e que pretende estimular o cumprimento do pagamento de dívidas é, segundo o director geral da Intrum Justitia, “desconhecida” e “a grande maioria das empresas não a aplica”.

Uma das soluções apontadas pelo dirigente seria, a seguir ao cumprimento do Estado, uma maior divulgação da lei por parte do Instituto de Apoio à Pequenas e Médias Empresas e à Inovação (IAPMEI) e da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP).