21.2.14

A maior preocupação dos portugueses "é a falta de esperança"

in Jornal de Notícias

O músico Pedro Abrunhosa disse, esta quinta-feira, em Macau, que a maior preocupação dos portugueses "é a falta de esperança", numa palestra que dedicou à crise e à emigração, e durante a qual também interpretou algumas músicas ao piano.

"A maior preocupação neste momento para os portugueses é a falta de esperança. E o discurso dos políticos não é um discurso otimista, não é um discurso esperançoso, é tudo menos um discurso poético. Poético não é de certeza, é um discurso tecnocrata, é um discurso hermético, às vezes até pernicioso, que repete uma mentira - a mentira da austeridade", afirmou.

Pedro Abrunhosa falava na palestra "Música e Arte: antídotos para a angústia social em tempos de números", no Instituto Politécnico de Macau, respondendo a um convite que o diretor do Centro Pedagógico e Científico de Língua Portuguesa justificou com o facto de o autor de "Contramão" ser poeta, além de músico. "É sobretudo um poeta, um homem do seu tempo e do seu país", disse Carlos André.

No início da palestra, um aviso à plateia, essencialmente lusófona: "Não venho anunciar o fim da crise em Portugal, como muitos gostariam e eu próprio gostaria", palavras do músico seguidas das notas ao piano: "Voámos em contramão/ E há de haver outro lugar/ E palavras para dizer/ Quando a terra abraça o mar/ É como um filho a nascer", tema que dá nome ao seu mais recente álbum, e que foi distinguido este ano pela Sociedade Portuguesa de Autores.

Pedro Abrunhosa invocou o "Manifesto contra a Crise - Compromisso com a Ciência, a Cultura e as Artes", que subscreveu com mais de cem intelectuais e cientistas portugueses, e que foi apresentado no final de janeiro, na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.

"Vivemos uma situação profundíssima de crise, em que grandes valores ao nível da cultura, da ciência e da academia têm de abandonar o país para poderem trabalhar e viver com dignidade. Portugal tornou-se um país pobre - se já era pobre empobreceu -, e a realidade é a frustração generalizada de que não há uma pessoa ou uma força a quem possamos culpar, é uma sensação de impotência", afirmou.

Pedro Abrunhosa tocou também a música "Para os braços da minha mãe", que fala da nova vaga de emigração.

Questionado sobre se já tinha pensado em sair de Portugal, como o fez há poucos dias o também cantor e compositor Fernando Tordo, Abrunhosa respondeu: "Não, nunca pensei. A questão do Fernando Tordo é um problema de mercado e da pequenez geográfica de um país culturalmente enorme".

Num contexto de crise, continuou Abrunhosa, "a música serve de paliativo social e válvula de escape" e também "serve para mudar o mundo".

"Saber que os portugueses choram comigo, mas também riem comigo é o que me faz continuar a escrever canções", acrescentou.

O músico dirigiu ainda algumas palavras sobre Macau: "Esta viagem foi muito benéfica. É uma aprendizagem constante. E retornar a Macau foi uma surpresa. Está muito diferente".

Pedro Abrunhosa é o vencedor da última edição do Prémio Pedro Osório, atribuído pela Sociedade Portuguesa de Autores, com "Contramão", o seu sétimo álbum de originais.

O prémio foi instituído em homenagem ao compositor falecido em janeiro de 2012, tem o valor pecuniário de dois mil euros e vai ser entregue no próximo dia 26, em Lisboa.