26.5.14

Há 170 mil “ocupados” que não contam para o desemprego

Margarida Peixoto e Cristina Oliveira Silva, in Económico

Peritos em mercado de trabalho, incluindo do Ministério das Finanças e do Banco de Portugal, estão atentos ao impacto das políticas activas de emprego.

Nos primeiros quatro meses deste ano, o número de pessoas registadas como "ocupadas" pelos centros de emprego quase duplicou face ao mesmo período de 2013. Há quase 170 mil "ocupados" que não contam para o desemprego do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP). Os números despertaram a atenção dos especialistas, que querem saber se este impacto está a ser significativo na retoma do mercado de trabalho. Mesmo dentro do Ministério das Finanças e do Banco de Portugal, o assunto está a ser seguido de perto, sabe o Diário Económico.

Em Abril, o IEFP contabilizou 668 mil desempregados. Mas neste grupo não estão incluídos 169.408 "ocupados" - pessoas que estão integradas em programas de emprego ou formação profissional, excluindo os que estão ao abrigo de programas que visam a integração directa no mercado de trabalho.

Entre Janeiro e Abril deste ano, o grupo dos "ocupados" aumentou 77,5% face aos mesmos quatro meses de 2013. Aliás, os números têm vindo sempre a crescer (acima de 50%) no último ano.

Este efeito, conjugado com o facto de a taxa de desemprego registada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) ter começado a cair no segundo trimestre de 2013, mesmo sem a economia a crescer a um ritmo significativo, despertou a atenção dos especialistas.

O Económico sabe que há peritos atentos aos números, tanto no Ministério das Finanças, como no Banco de Portugal. Não se trata de desconfiar das estatísticas do INE ou do IEFP, sobre o mercado de trabalho, mas sim de avaliar o impacto das políticas activas de emprego na sua recuperação.

É que isso faz diferença na hora de projectar o comportamento futuro da economia. Se o impacto for relevante, recomenda-se cautela em relação às expectativas para a actividade económica. "É muito claro que uma boa parte da redução no número de desempregados tem a ver com isso. Talvez mais de metade", diz uma fonte que está atenta aos números, referindo-se aos dados do IEFP.

Pedro Martins, ex-secretário de Estado do Emprego do actual Governo, avança outra estimativa e diz que o crescimento destes apoios explica "entre um quarto e um terço" da subida do emprego. "Há também um efeito de interacção entre a economia e estes apoios: as empresas estão mais dispostas a contratar e havendo estas medidas, têm mais interesse", frisa.

A prova dos nove é difícil de tirar. Os dados dos centros de emprego mostram que se todos os "ocupados" fossem contabilizados como desempregados, então o desemprego ainda estaria a subir. Mas também é certo que é o facto de estar a ser feito um esforço grande nas políticas activas de emprego que faz com que muitas pessoas se inscrevam no IEFP.

Se forem usados os dados do INE, não é mais simples retirar conclusões: o instituto não desagrega a informação da mesma forma. Aqui, o factor mais relevante é se a pessoa recebe uma remuneração, independentemente de estar a ser paga pela empresa ou pelos cofres públicos.

É por isso que não é fácil isolar o efeito das políticas activas de emprego na melhoria do mercado de trabalho. Por exemplo, entre Estágios-Emprego e Contratos Emprego Inserção (trabalho socialmente necessário), o IEFP registava quase 65 mil pessoas (valores acumulados de Março). Nas estatísticas do INE, este grupo faz parte da população empregada - porque recebem uma remuneração além do subsídio de alimentação ou transporte.

Em Fevereiro, o presidente do IEFP, Jorge Gaspar, reconheceu o impacto das políticas activas de emprego. Mas defendeu que não deve ser feita uma leitura administrativa desta questão. "Essa relação dicotómica está na lei", argumentou. "Ou acreditamos nas políticas activas de emprego e de formação profissional, ou não. Se não acreditamos, a visão administrativa da realidade impõe-se", explicou na altura.

João Cerejeira, professor na Universidade do Minho, também não subscreve a tese de que o emprego criado seja "falso". E explica: "De certa maneira, [estas políticas] favorecem os números do desemprego e emprego, mas também é verdade que um número muito significativo destas pessoas, mesmo sem a medida provavelmente também estariam empregadas".

Francisco Madelino, ex-presidente do IEFP, também reconhece que não é só o efeito do crescimento económico que faz subir os números do emprego. "As políticas activas de emprego, em conjunto com a economia, explicam a evolução", garante.