26.11.14

Há 73 queixas por dia de violência doméstica em Portugal

Por Marta F. Reis, in iOnline




Amanhã assinala-se o Dia Internacional pela Eliminação da Violência Contra as Mulheres. Agressões por parceiros são as mais comuns




Conceição foi morta pelo ex-companheiro na manhã do dia 27 de Outubro, quando saía para o trabalho. Já teria feito queixa à polícia e tinha passado os dias anteriores em casa de amigos com receio do homem de 33 anos, que terá esperado por ela à porta do prédio na Quinta de Santo António, em Leiria. Fernanda e a filha mais velha foram mortas na noite de 20 de Outubro no apartamento da família em Soure. Só a filha mais nova, de 13 anos, sobreviveu ao duplo homicídio cometido pelo pai, alegadamente movido por ciúmes e até então visto como o chefe de família perfeito. Também terão sido os ciúmes que levaram um homem de 47 anos a assassinar uma mulher com quem teria uma relação extraconjugal no dia 11 de Setembro em Guiães, Vila Real. Aurora teria começado uma relação há dois meses e deixou quatro filhos, dois deles menores.

Amanhã assinala-se o Dia Internacional pela Eliminação da Violência Contra as Mulheres, uma iniciativa das Nações Unidas. Os crimes de violência doméstica são os mais comuns praticados contra mulheres e motivam cada vez mais queixas, também em Portugal. Só no primeiro semestre os casos reportados às polícias registaram um aumento de 2,3% face ao mesmo período do ano passado, num total de 13 071 participações. São 73 queixas por dia, três por hora. Só este ano a UMAR - União de Mulheres Alternativa e Resposta já contabilizou 31 mulheres mortas por companheiros, actuais ou passados. Foram ainda registados outros seis homicídios em que os agressores eram familiares directos ou por afinidade das vítimas.

Para assinalar a data, a UMAR coligiu informação sobre todas as vítimas registadas até 30 de Outubro, num ano que deverá ser um dos mais negros desde que existem estas estatísticas. A informação foi remetida a algumas autarquias, que estão a preparar iniciativas para assinalar a data, explicou ao i Elisabete Brasil, responsável pelo Observatório de Mulheres Assassinadas da UMAR. No dia 10 de Dezembro, data em que encerra oficialmente a campanha das Nações Unidas contra a violência de género - que este ano apela a todas as comunidades a vestirem-se de laranja e mobilizarem-se pelo fim das agressões - a UMAR irá apresentar o seu relatório anual que, pela primeira vez, fará um balanço sobre os órfãos da violência doméstica em Portugal.

Segundo os dados fornecidos ao i pela UMAR, este ano a maioria das mulheres vítimas de violência doméstica foram mortas em casa com armas de fogo. Tinham idades entre os 19 e os 82 anos.

Iniciativas de Norte a Sul Várias iniciativas em todo o continente e ilhas vão assinalar o Dia Internacional pela Eliminação da Violência Contra as Mulheres, instituído pelas Nações Unidas em 1999 e que nasce de uma homenagem a três irmãs activistas políticas mortas na República Dominicana em 1960, já que além da violência doméstica, está em causa a denúncia de todo o tipo de violência contra as mulheres à escala mundial.

Em Braga, na Escola de Direito da Universidade do Minho, terão lugar as Primeiras Jornadas Contra a Violência Doméstica, organizadas pela instituição e pela Associação Portuguesa de Apoio às Vítimas. Já em Vila Real, onde este ano já houve registo de dois homicídios, terá lugar uma conferência com o tema "Mulheres Vítimas de Violência - Retratos de Vida", no teatro da cidade.

A APAV, que lembra que mais de 81% das pessoas atendidas nos seus 15 gabinetes de apoio à vítima são mulheres, fará uma acção de sensibilização na rua Augusta, em Lisboa.

Também na capital, pelas 18h, uma acção promovida pela Associação para o Planeamento da Família (APF) assinalará a data com uma performance na estação de comboios do Cais do Sodré, seguida de uma marcha organizada pela APAV, Associação Portuguesa de Mulheres Juristas, UMAR-União de Mulheres, Alternativa e Resposta, Amnistia Internacional Portugal, Associação Portuguesa de Estudos sobre as Mulheres, Associação Democrática de Defesa dos Interesses e Igualdade das Mulheres, Rede Portuguesa de Jovens para a Igualdade de Oportunidades entre Mulheres e Homens e Grupo de Activismo e Transformação pela Arte - GATA.

Em Cascais, o projecto 3D's - Direitos e Deveres pela Dignidade, que dinamiza um grupo de sobreviventes para prestar apoio a vítimas e acompanhou 85 pessoas este ano, apresenta a partir das 9h30 um guia sobre o processo judicial no crime de violência doméstica.

Em Coimbra, distrito onde este ano foram registadas três vítimas de homicídio, em Soure, está marcada uma concentração pelo fim da violência contra as mulheres na Praça 8 de Maio, pelas 10 horas. No Alentejo, o teatro municipal de Vila Nova de Santo André e o Núcleo de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica do distrito de Portalegre têm também marcados encontros dedicados à sensibilização para a violência.

uma em três mulheres As Nações Unidas classificam de pandemia a repetição de crimes contra as mulheres e a Organização Mundial de Saúde também apelou nos últimos dias a mais esforços para prevenir este tipo de violência. As estimativas mundiais sugerem que uma em cada três mulheres já viveu algum tipo de violência física ou sexual por parte dos seus parceiros.

Segundo o maior inquérito europeu realizado até à data sobre violência contra mulheres, divulgado em Março, Portugal é o país onde é mais generalizada a percepção de que a violência contra mulheres é comum, embora a taxa de incidência apurada na população portuguesa para violência perpetuada por parceiros, actuais ou passados, não tenha sido mais elevada no espaço europeu. Ainda assim, segundo o estudo quase duas em cada dez mulheres portuguesas (19%) sofreram algum tipo de violência por parte de companheiros.

O questionário, que inquiriu 42 mil mulheres permitiu estimar que nos 12 meses anteriores 13 milhões de mulheres na Europa foram agredidas fisicamente e 3,7 milhões sexualmente. Uma em cada 20 mulheres disse ter sido obrigada pelo menos uma vez desde os 15 anos de idade a ter relações sexuais à força.