11.6.15

A mobilidade europeia

por Adriano Moreira, in Diário de Notícias

Por enquanto, os fatores que parecem obrigar a repensar o projeto da unidade política europeia, consagrada formalmente no Tratado de Lisboa, incluindo as possibilidades de alargamento, sofreram uma alteração de previsibilidade que tem como primeira referência o resultado das eleições britânicas, a relação da Grécia com a dúvida sobre se estamos perante um problema que é dela, ou é um problema da União, dúvida agravada pela falta de conceito estratégico que esta mantém.

A lista cresceu com a declaração de Putin ao anunciar que definiu a Rússia como o Império do Meio, com fronteiras de interesses mais vastas do que as geográficas que em todo o caso vai alargando, e finalmente com a questão mantida em segredo pelas chancelarias, que é a de saber se a União, como parte, e o Ocidente, como todo a que pertence, estão em paz ou em guerra depois de o chamado autointitulado Estado Islâmico do Iraque e do Levante declarar que inclui, no seu plano de combate em curso, destruir Roma, os seus símbolos, o que implica perceber que a ocupação dos territórios está em causa. Este último facto é mais inquietante quando se recorda que a mobilidade interna das fronteiras europeias, mesmo sem esquecer a afirmada unidade espiritual que os projetistas da paz nunca deixaram de fazer ao longo dos séculos, foi sobretudo dinamizada por conflitos militares.

Para não recuar muito no tempo, basta ter em conta os factos ainda presentes na experiência e memória de grande parte da geração viva. A Primeira Guerra Mundial, de 1914-1918, terminou com a consagração do princípio da unidade entre Nação e Estado, constante dos princípios de Wilson, um princípio fundado em valores considerados eticamente ocidentais mas que implicaram o fim dos impérios, alguns multiculturais, europeus, incluindo a Alemanha, a Áustria-Hungria, a Rússia, a Turquia, não conseguindo ainda assim acabar com a questão das minorias várias.

A Segunda Guerra Mundial, de 1939-1945, consagrou a ética da descolonização a favor da liberdade dos povos colonizados, eles próprios frequentemente multiculturais, mas tendo como corolário a retirada dos Estados da frente marítima atlântica europeia, com custos humanos pesados de todos eles. Não é fácil encontrar governos que se possam qualificar de "bons governos" quando fazem das capacidades militares o instrumento de expansão mais evidente nas relações com outros, mas nesta infeliz data de entrada no século XXI, as ameaças mais sérias parecem por vezes contraditórias: por um lado, a unidade da Europa, mais uma vez, é posta em causa pelas pequenas pátrias que talvez se recordem mais de Wilson do que dos fundadores da União, todas esperando conseguir que o de-senvolvimento, nas suas mãos, seja de facto o novo nome da paz; depois, a enfrentar a utilização de valores religiosos pelos conceitos estratégicos dos movimentos terroristas, que agora se atribuem a natureza de Estado.

É absolutamente evidente que os danos já causados não anunciam um fácil retorno à deposição das armas, antes, pelo contrário, muitos analistas usam a expressão "guerra em toda a parte", o que implica que a guerra tenha como efeito agravar a crise global económica e financeira, a pobreza crescente e generalizada, que por exemplo vai transformando o Mediterrânio num cemitério, ainda que conseguindo resultados satisfatórios para os complexos militares - industriais e os centros de poder não conhecidos ou não cobertos por tratados, nas áreas da economia. Alguns defendem a teoria de que a principal causa da pobreza, e logo da quebra da paz pelos mesmos interesses, é a de maus governos, e talvez nesta data tão semeada de ameaças e péssimos resultados conseguidos tenhamos de reconhecer que existe mais anarquia internacional do que governanças estruturadas, e uma falta de estadistas evidente quando recordamos os gigantes que esqueceram os combates e as destruições para reconstruir a Europa finalmente unida, e de novo a dar sinais de adotar ritmos de mobilidade de um passado que os referidos fundadores quiseram para sempre impedir.