28.10.15

SEF sem acesso aos campos de refugiados em Itália

Mónica Silvares, in Económico on-line

Os mecanismos europeus estão prontos e funcionam, o problema reside nos governos que não têm actuado de modo uniforme, dizem os especialistas. Falta liderança política no processo de acolhimento dos refugiados.
SEF sem acesso aos campos de refugiados em Itália

Portugal está disponível desde Setembro para acolher refugiados. Mas as semanas passam e não há novidades. Porquê? “Simplesmente porque a Comissão Europeia e a Itália ainda não enviaram o primeiro grupo”, explica o director nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, António Beça Pereira. O problema não reside na ineficiência das instituições europeias, mas nos próprios Estados-membro e isso explica que em toda a Europa apenas tenham sido colocados 82 refugiados. Por exemplo, “Itália não tem permitido o acesso dos oficiais de ligação aos campos onde se encontram os refugiados, nomeadamente do SEF”, reconhece Beça Pereira, no programa Europa.28 do Etv, que pode ver hoje às 14h05.

A identificação dos refugiados está a ser feita pelas agências europeias e só quando o processo estiver terminado será possível recolocá-los nos países de acolhimento. Em cada país de trânsito há oficiais de ligação que asseguram a chegada tranquila das famílias ao seu destino final. No caso português, há dois inspectores do SEF, um na Grécia outro em Itália. Contudo, em Itália o acesso aos campos é vedado. “Era desejável que os oficiais de ligação tivessem esse acesso, até porque não são assim tantos”, diz Beça Pereira, embora reconheça como válido o argumento de se restringir o acesso de pessoas estranhas aos campos.

O primeiro contingente a chegar ao nosso país deverá ter cerca de 100 pessoas, sobretudo, eritreus, sírios e iraquianos, confirmou o alto-comissário das migrações, Pedro Calado. Nos corredores em Bruxelas, esta semana, chegou a admitir-se que Portugal venha a receber 130, mas não há qualquer confirmação oficial deste valor, disse Beça Pereira. No terreno está tudo a postos para receber imediatamente três mil pessoas, mas a ideia de começar com um grupo mais pequeno é também testar a resposta no terreno. “À data de hoje diria que temos capacidade para três mil pessoas”, diz Pedro Calado. O mapeamento da resposta no terreno foi concluído a semana passada, com um levantamento nacional das entidades públicas e civis do que podem ser protocolos de acolhimento dos refugiados e há já 63 câmaras em todo o país dispostas a colaborar.

Perante a espera interminável, Rui Marques, o responsável pela Plataforma de Apoio aos Refugiados, lança uma provocação: “Se nada acontecer é tempo de Portugal estabelecer um canal bilateral, por exemplo com a Grécia, para poder acolher refugiados registados”. Considerando que o cenário se está a tornar “explosivo”, Rui Marques frisou que é “preciso desbloquear a situação”. “Precisamos dar passos disruptivos e fora da caixa. Não podemos ficar eternamente paralisados por uma Europa que não funciona”, frisa. Beça Pereira não acata a sugestão e lembra que “a resposta tem de ser sempre europeia e no âmbito das instituições”. Contudo, Beça Pereira reconhece que seria lamentável se, no final de Novembro, Portugal ainda não tiver recebido o primeiro grupo de refugiados.

“A Europa não estava preparada para esta tragédia, não tinha mecanismos de resposta e não estava preparada para isto”, defendeu por seu turno o antigo ministro dos Negócios Estrangeiros, António Martins da Cruz. “E quando os encontrou, ao fim de alguns meses, é incapaz de implementá-los”, não por falta de meios, mas porque “não há vontade política” já que vieram ao de cima “os nacionalismos e uma desresponsabilização de uns países em relação aos outros”.

Em mais uma tentativa para desbloquear a situação, o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, prometeu ontem que os países envolvidos na luta contra a crise dos refugiados terão margem de manobra “acrescida” na avaliação do cumprimento da meta de 3% de défice estabelecida pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento. “O PEC passa para segundo plano no momento de responder à crise”, disse Juncker no Parlamento Europeu.