22.1.16

Riqueza. Fosso entre ricos e pobres volta a agravar-se

SÓNIA PERES PINTO, in "Jornal I"

Riqueza de 1% da população supera a dos restantes 99%, revela o último relatório da Oxfam

A concentração de riqueza continua imparável. No ano passado, as 62 pessoas mais ricas do mundo tinham a mesma riqueza que a soma da metade mais pobre do planeta. Isto significa que a riqueza acumulada por 1% da população mundial, os mais ricos, superou a dos 99% restantes. Os dados foram revelados no último relatório da Oxfam, “Uma economia ao serviço de 1%”.

No ano passado, a organização não governamental (ONG) britânica estimava que isso acontecesse em 2016. “No entanto, aconteceu em 2015: um ano antes”, sublinha.

Há cinco anos eram necessários 388 milionários. “O fosso entre a franja dos mais ricos e o resto da população (o planeta) aumentou de forma dramática nos últimos 12 meses”, salienta a organização.

Mas as novidades não ficam por aqui. Desde 2010, a riqueza dos mais ricos cresceu 44%, enquanto os mais pobres recuaram 41% no mesmo período.

Face a estes resultados, a ONG apela à necessidade de agir. “Não podemos continuar a deixar que centenas de milhões de pessoas tenham fome quando os recursos para os ajudar estão concentrados, ao mais alto nível, em tão poucas pessoas”, afirma Manon Aubry, diretora dos assuntos de justiça fiscal e desigualdades da Oxfam em França.

Segundo a organização, “desde o início do século xxi que a metade mais pobre da humanidade beneficia de menos de 1% do aumento total da riqueza mundial, enquanto os 1% mais ricos partilharam metade desse mesmo aumento”.

Cerca de metade dos mais ricos residem nos EUA. Há 17 milionários europeus e os restantes vivem em países como a China, Brasil, México, Japão e Arábia Saudita.

Solução

Para a ONG, a forma mais eficaz de combater estas desigualdades é acabar com os paraísos fiscais, que permitem o desvio de fortunas que não são tributadas. “Devemos apelar aos governos, empresas e elites económicas presentes em Davos para que se empenhem em acabar com esta era de paraísos fiscais, que alimentam as desigualdades globais, e impeçam que centenas de milhões de pessoas vivam na pobreza”, diz Winnie Byanyima, diretora-geral da Oxfam International (ver texto ao lado).

E dá o exemplo da riqueza de África, uma vez que se estima que 30 por cento dos rendimentos financeiros do continente não são tributados. Para a Oxfam, este dinheiro chegaria para salvar a vida de 4 milhões de crianças todos os anos, para pagar os salários de professores e educar todas as crianças.

A Oxfam dá ainda sugestões para combater estas desigualdades e dá como exemplo o pagamento de melhores salários, a promoção da igualdade económica das mulheres, o estabelecimento de registos obrigatórios de atividades de lobbying, a separação de empresas do financiamento de campanhas e a priorização de políticas, práticas e gastos que aumentem o financiamento de sistemas públicos de saúde e educação.

“Desde aumentos no salário mínimo a medidas para regular mais eficazmente a evasão fiscal, há muito a fazer para atenuar este cenário e começar a construir uma economia humana que beneficie a todos”, salienta a organização.

A organização reconhece, no entanto, que o número de pessoas que viviam no limiar de extrema pobreza caiu para metade entre 1990 e 2010, sendo ainda assim insuficiente para se encontrar uma solução que contorne a desigualdade. “Se a distância entre ricos e pobres dentro dos países não tivesse aumentado no decorrer desse período, outros 200 milhões de pessoas teriam saído da pobreza”, afirma.

Metodologia

O certo é que estes resultados estão longe de chegar a um consenso. Já no passado, vários economistas contestaram a metodologia utilizada pela Oxfam, com a ONG a defender o método utilizado no estudo de forma simples: o cálculo do património líquido, ou seja, os ativos detidos menos dívida.

Por seu lado, a diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, mostra-se também preocupada com estas desigualdades, tendo afirmado que “se não for controlada, a desigualdade económica vai fazer regredir a luta contra a pobreza e ameaçará a estabilidade global”.